Falta de oportunidades mantém cientistas brasileiros no exterior
Enquanto alguns cientistas preferem trabalhar fora do Brasil, outros retornam ao país sem perspectivas de trabalho
14 fev 2017, 05h55
- Atualizado em 14 fev 2017, 14h40
Em carta enviada ao presidente Michel Temer, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) mostraram-se preocupadas com a união dos ministérios. “A fusão enfraquece o setor da ciência, tecnologia e inovação que, em outros países, ganha importância.”
A preocupação não é para menos. Em janeiro de 2017, o governo federal retomou integralmente o orçamento de 1,7 bilhão para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). A medida foi tomada depois de uma grande mobilização da comunidade científica. No entanto, apenas 1,1 bilhão desse investimento será voltado para as bolsas do CNPq — 200 milhões a menos do que no ano passado.
Com esse cenário em vista, financiamentos alternativos são cada vez mais necessários para o desenvolvimento de estudos, aponta Fernanda Werneck, pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em entrevista a EXAME.com.
Para continuar sua pesquisa, que visa aprimorar o conhecimento sobre a biodiversidade na região de transição Amazônia-Cerrado, Werneck precisou do investimento de várias instituições privadas e internacionais, como a Agência para Desenvolvimento Internacional dos Estados Unidos (USAID).
Além disso, no ano passado, ela foi uma das ganhadoras do prêmio “Para Mulheres na Ciência”, promovido pela L’Oréal juntamente com Unesco e Academia Brasileira de Ciências (ABC). “Esse prêmio não precisaria ser usado para o estudo, pois é uma bolsa auxílio. Mas, eu vou usar para a pesquisa, pois preciso pagar os projetos de pesquisa dos meus alunos e finalizá-la”, conta Werneck.
A pesquisadora, que já foi bolsista do CNPq e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), credita parte do seu sucesso à sorte de ter passado em bolsas um pouco antes de elas serem extintas. “Fui bolsista Jovem Talento do Ciência Sem Fronteiras alguns editais antes de acabar e, por isso, tive a oportunidade de continuar meus estudos.”
Segundo Werneck, vários amigos foram estudar fora do Brasil com bolsas desse tipo e não conseguiram voltar devido à falta de oportunidades. Ela aponta que isso causa a evasão de cérebros que poderiam colocar o Brasil no centro do mapa mundial da ciência.
Duília de Mello, astrônoma da Nasa, foi um dos “cérebros” que decidiram continuar no exterior. Ela conta em entrevista a EXAME.com que pensou em voltar ao Brasil entre os anos de 2009 e 2010, porém não teve sucesso. “Eu tentei uma vaga como Diretora do Observatório Nacional e não fui aceita, pois não fiz carreira no Brasil”, conta.
Uma pesquisa realizada pelo jornal O Globo com 100 membros da Academia Brasileira de Ciências (ABC), no segundo semestre de 2016, revelou que 23% dos cientistas da organização cogitavam sair do país e 76% reclamavam da falta de apoio dos governos às pesquisas.
Enquanto alguns pesquisadores continuam seus estudos no exterior, outros abandonam a carreira quando voltam ao Brasil, conta Werneck. “Vários amigos estão tentando concursos públicos em áreas não relacionadas com a ciência.”
A pesquisadora do Inpa ainda ressalta que muitos cientistas que retornam ao país ficam presos em cargos administrativos. “Eu, por exemplo, acabei recentemente o estágio probatório e já fui convidada para assumir vários cargos de gestão”, explica. “É importante fazer gestão de ciência, mas se você sobrecarrega os pesquisadores logo no início, você pode dificultar muito o progresso de suas carreiras.”
De acordo com dados da ABC, o Brasil tem 710 cientistas por cada milhão de habitantes, contra 7.600 no grupo de 34 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Fonte: EXAME
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