Cientistas usam vírus da
zika para matar células de tumor cerebral
Conhecido por destruir células que formam cérebro
de bebês em desenvolvimento, vírus foi utilizado em experimento para matar
células-tronco de glioblastoma, o tipo mais comum de câncer cerebral
Fábio de
Castro, O Estado de S.Paulo
05
Setembro 2017 | 10h00
Vírus da
zika (verde) ataca células-tronco (vermelho) em amostra de glioblastoma humano
Foto: Zhu et al, 2017
O vírus
da zika é capaz de matar células-tronco de glioblastoma, um tipo mortal de
câncer no cérebro, de acordo com um novo estudo realizado por cientistas
americanos. As células-tronco dos tumores são especialmente resistentes aos
tratamentos convencionais contra o câncer.
De acordo
com os autrores da pesquisa, publicada hoje na revista científica The Journal
of Experimental Medicine, a descoberta abre caminho para que um dia o zika seja
utilizado como um tratamento complementar para o glioblastoma.
Sabendo
que o zika tem preferência por destruir células-tronco do cérebro de bebês em
desenvolvimento - causando malformações como a microcefalia -, os pesquisadores
decidiram investigar se essa característica do vírus poderia ser dirigida
contra as células de glioblastoma, que é o tipo mais comum de tumor cerebral.
"Nós
mostramos que o vírus da zika pode matar o tipo de célula de glioblastoma que
tende a ser resistente aos tratamentos atuais, levando a maior parte dos pacientes
à morte", disse um dos autores do estudo, Michael Diamond, da Universidade
Washington, em St. Louis (Estados Unidos).
Atualmente
o tratamento padrão para o glioblastoma é extremamente agressivo, incluindo
cirurgia, quimioterapia e radioterapia. Ainda assim, a maior parte dos tumores
voltam a aparecer dentro de seis meses.
De acordo
com os autores do estudo, as chamadas células-tronco do glioblastoma
frequentemente sobrevivem ao agressivo tratamento e continuam se dividindo,
produzindo novas células tumorais que susbstituiem aquelas que foram mortas
pelas cirurgias e drogas.
"É
frustrante tratar um paciente de forma tão agressiva, apenas para vermos seu
tumor voltar a aparecer alguns meses depois. Nós imaginamos que talvez a
natureza pudesse fornecer uma arma para atacarmos as células que são
provavelmente as maiores responsáveis por esse ressurgimento", disse outro
dos autores do estudo, Milan Chheda, também da Universidade Washington.
Os
cientistas notaram que as células-tronco do glioblastoma, com sua capacidade
quase ilimitada de produzir novas células, lembram as células
neuroprogenitoras, que são responsáveis por gerar células novas para o cérebro
em desenvolvimento. As células neuroprogenitoras são os alvos preferidos do
vírus da zika.
Em
colaboração com pesquisadores da Universidade da Califórnia em San Diego, os
cientistas da Universidade de Washington testaram se o vírus poderia matar
células-tronco em glioblastomas removidos de pacientes em biópsia para
realização do diagnóstico.
Os
cientistas infectaram os tumores com o vírus da zika, que se espalhou pelos
tumores, infectando e matando as células-tronco de câncer, evitando claramente
as demais células tumorais.
A
descoberta sugere que a infecção por zika e um tratamento com quimioterapia e
radioterapia podem ter efeitos complementares. Os tratamentos padrão matam as
células tumorais em massa, mas frequentemente deixam intactas as céulas-tronco,
que acabam regenerando o tumor.
O vírus
da zika, por sua vez, ataca as células-tronco, mas ignora a maior parte do
tumor. "Imaginamos que um dia o zika vá ser utilizado em combinação com as
terapias já existentes para erradicar o tumor completamente", disse
Chheda.
Para
descobrir se o vírus poderia ajudar a tratar o câncer em um animal vivo, os
cientistas injetaram o vírus da zika nos cérebros de 18 camundongos e uma
solução de água salgada (um placebo) no cérebro de outros 15 animais.
Duas
semanas após a injeção, os tumores ficaram consideravelmente menores nos
camundongos tratados com zika, que também sobreviveram bem mais tempo que os
animais que receberam o placebo.
Injeção no cérebro
Se o zika
fosse utilizado em humanos, o vírus precisaria ser injetado no cérebro,
provavelmente durante a cirurgia de remoção do tumor primário. Se o vírus fosse
introduzido em outra parte do corpo, o sistema imunológico da pessoa o
destruiriria antes que ele chegasse ao cérebro.
Segundo
os autores do estudo, a ideia de injetar no cérebro de uma pessoa um vírus conhecido
por causar danos cerebrais pode soar alarmante, mas o zika poderia ser seguro
para uso em adultos, porque seus alvos principais - as células
neuroprogenitoras - são raras no cérebro já desenvolvido.
O cérebro
do feto, por outro lado, é repleto dessas células, o que explica, em parte, por
que a infecção por zika antes do nascimento produz graves danos cerebrais,
enquanto a infecção natural na idade adulta causa apenas sintomas mais amenos.
Fonte: Estadão
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