quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Carta achada por estudante mostra como Galileu tentou enganar a Inquisição

Carta achada por estudante mostra como Galileu tentou enganar a Inquisição


Encontrada por um estudante italiano de pós-graduação nos arquivos da Royal Society, a missiva prova que o astrônomo editou o documento original para suavizar suas opiniões
Galileo Galilei
A carta de Galileo.
Madri

Quase quatro séculos depois que Galileu Galilei foi condenado pela Inquisição por heresia, surgem novos detalhes sobre o caso. Salvatore Ricciardo, um estudante de pós-graduação da Universidade de Bergamo, encontrou em um arquivo mal datado da Royal Society a carta do astrônomo a um amigo, na qual, ciente do perigo, o cientista buscava moderar as ideias apresentadas em outro documento e que no final o condenariam, de acordo com a revista Nature.
Existem várias cópias da carta e há duas versões diferentes, a que foi enviada à Inquisição em Roma e outra com uma linguagem mais sutil. Existem também várias cópias em diferentes depósitos. Como o original se perdeu, não se sabia se foram os acusadores que manipularam a carta para reforçar seus argumentos em favor de uma condenação por heresia –como se queixava o astrônomo para seus amigos– ou se Galileu escreveu a versão mais potente e depois decidiu suavizá-la, como agora ficou demonstrado.
Mas, o que ele dizia? A carta encontrada tem sete páginas, é datada de 21 de dezembro de 1613 e assinada por G.G., e parece resolver esse mistério. Ela é remetida a seu amigo Benedetto Castelli e nela Galileu afirma que, como na Bíblia há poucas referências à astronomia, estas não devem ser tomadas ao pé da letra porque, além do mais, foram simplificadas para que as pessoas as pudessem entender. Mais importante que isso, Galileu diz que a teoria heliocêntrica formulada por Copérnico 70 anos antes não era incompatível com a Bíblia.
Castelli devolve ao astrônomo a carta com a qual a perseguição começou em 1613. A que está preservada nos arquivos do Vaticano é a que o clérigo dominicano Niccolo Lorini enviou para a Inquisição em 1615, que seria fatal para o destino de Galileu, e que ele tentou suavizar. De fato, Galileu enviou a versão suavizada a seu amigo Piero Dini, clérigo em Roma, e lhe pediu que a mandasse ao Vaticano, afirmando que a outra tinha sido manipulada e se queixando da "malícia e ignorância" de seus amigos. Essa é a versão que foi encontrada agora.

Mitos e zombaria
Em 22 de junho de 1633, o físico e astrônomo, de 69 anos, foi forçado a renegar de joelhos de sua doutrina perante a comissão dos inquisidores. Ele nem sequer chegou a dizer eppur si muove (e, no entanto, ela se move). Depois dessa abjuração, a condenação à prisão perpétua foi comutada para prisão domiciliar por toda a vida. Galileu morreria em 1642.
Em 1632, Galileu publicou o Diálogo sobre os Dois Principais Sistemas do Mundo, no qual defendia a concepção heliocêntrica do universo formulada por Copérnico. Ou seja, Galileu argumentava que a Terra girava em torno do Sol. Essa teoria já havia sido censurada pela Inquisição em 1616 e a proibição é, precisamente, motivo de escárnio no texto de Galileu, segundo conta Jaime Rubio neste artigo de Verne.
As análises comprovam que a carta foi escrita por ele e que ela ficou adormecida 250 anos nos arquivos da Royal Society, escondida da visão. Sua validade também foi certificada por Allan Champan, historiador da Universidade Oxford e presidente da Sociedade de História da Astronomia, que festeja as novas perspectivas que ela traz sobre "um período crítico da história".
A edição inclui uma frase em que "falso" é substituído por "uma visão diferente da verdade" ou, por exemplo, "ocultar" por "cobrir" entre outras modificações, incluídas por Ricciardo e seu orientador da tese, Franco Giudice, e o historiador Michelle Camerotta em um estudo na publicação Notes and Records, da Royal Society.

Fonte: El País

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