Como evitar novos Marianas e Brumadinhos? A resposta está na tecnologia
Para que outras
tragédias ambientais não ocorram, a obrigatoriedade de atualizações em
tecnologia e em processos de controle e licenciamento é fundamental
27 jan 2019, 17h36 - Publicado em 27 jan 2019, 14h30
Na sexta-feira (25), o município mineiro de Brumadinho vivenciou uma tragédia que remonta à ocorrida há três anos. Em outro município mineiro a cerca de 162 quilômetros de distância, chamado Mariana, o rompimento da barragem de Fundão, responsabilidade de mineradora Samarco, deixou 19 mortos. Agora, em Brumadinho, uma barragem de rejeitos de minério da gigante Vale, que co controla a Samarco com a anglo-australiana BHP Billiton, rompeu e a lama invadiu a região, deixando 37 mortos até o momento.
Mais uma barragem corre o risco de romper neste momento, desta vez de água. Cerca de 24 mil pessoas estão sendo evacuadas pelos bombeiros das áreas sob risco, segundo o porta-voz do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, tenente Pedro Aihara. As áreas Parque da Cachoeira, Pires, Centro de Brumadinho e Bairro Novo Progresso estão sob alerta de risco.
A Vale teve 11 bilhões de reais congelados, com o objetivo de compensar os prejuízos e danos ambientais provocados pelo rompimento da barragem. Além do bloqueio de bens, a última medida judicial determina que a empresa deve assumir a responsabilidade da assistência às vítimas e seus parentes. A mineradora está cadastrando interessados em prestar apoio aos atingidos pelo rompimento da barragem em Brumadinho e recebe dados de sobreviventes encontrados, reporte de desaparecidos e solicitação de apoio emergencial (abrigo, água, cesta básica, roupa, medicamento, transporte etc) e reparação.
“Somos vítimas da Vale. Ainda há muito trabalho pela frente. Vou contribuir para que Brumadinho não seja enrolado pelas mineradoras como somos em Mariana”, disse Duarte Júnior, prefeito de Mariana, que está em Brumadinho para prestar solidariedade.
Mas, para os técnicos, o financeiro e o humanitário não bastam para prevenir outros desastres como os de Mariana e Brumadinho. É preciso ter tecnologias atualizadas.
Segundo Eugênio Singer, especialista em engenharia ambiental e diretor brasileiro da consultoria Ramboll, a maioria dos desastres podem ser evitados quando não há uma movimentação natural atípica, dos choques de placas tectônicas às erupções vulcânicas e tsunamis.
“Existem sistemas de monitoramento de riscos geotécnicos avançados, com equipamentos de gestão da integridade das barragens como acelerômetros, inclinômetros e satélites radares, por exemplo”, diz Singer.
Um caso a relembrar é o da Petrobras. Entre os anos 2000 e 2001, a petrolífera sofreu grandes desastres: o vazamento de óleo de Baía de Guanabara, outro vazamento na Repar [Refinaria Presidente Getúlio Vargas] e a explosão da plataforma P-36. A empresa investiu quatro bilhões de dólares para rever o gerenciamento de processos de segurança, gerando o programa de contingência Pegaso.
As barragens de Fundão e Santarém, presentes no desastre de Mariana, também implantaram equipamentos após a tragédia ambiental. “Essas tecnologias podem tornar-se obrigatórias. A gestão de integridade geotécnica de barragem tem de ser implantada e aprimorada.”
Ajudaria no caso de Brumadinho, especialmente para identificar seus arredores. Suas barragens eram de baixo risco, em termos de métodos de construção e monitoramento, mas havia alto potencial de impacto diante do meio ambiente existente ao redor do fluxo de água: comunidades, escolas, hospitais, sistemas de abastecimento de água, depósitos e produtos químicos e perigosos e empreendimentos industriais, por exemplo.
Para Singer, é fundamental que a Vale resgate as vítimas e pessoas involuntariamente desalojadas; crie um sistema emergencial de indenização, com um cadastro participativo; aprimore seu sistema de comunicação, de infraestrutura logística de acesso e de governança, com participação das comunidades; reveja todo sistema de alerta, pois existem mais barragens em risco; elabore um plano de reassentamento rápido com verbas já mobilizadas; e, depois, prepare um plano emergencial para os impactos e danos da lama ao fluxo de água até a hidrelétrica, em um trajeto de 220 quilômetros.
A necessidade de aprimoramento de sistemas é reforçada por Rodrigo Jorge Moraes, doutor em direito ambiental e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). O especialista declarou anteriormente que o novo rompimento de barragem após três anos do desastre de Mariana demonstra que não houve significativa melhora nos protocolos de crise e redução de riscos deste tipo de episódio.
“Esse evento mostrou novamente não só o despreparo da empresa responsável, mas também do poder público em agir rapidamente em momentos de crise ambiental, informação e deslocamento da população.”
A Agência Nacional de Águas (ANA) detectou, nos últimos três anos, um total de 54 barragens de água do país com problemas na infraestrutura. Esse volume equivale a mais da metade do total das 104 barragens que a agência fiscaliza. Hoje, segundo a ANA, há apenas seis funcionários do órgão em todo o país para executar esse trabalho de fiscalização.
E a Justiça?
Para Moraes, a tragédia de Brumadinho responsabilizará a empresa e seus representantes nas esferas administrativa, civil e criminal quanto às leis 6938/81, da Política Nacional do Meio Ambiente, e 9605/9, a Lei de Crimes Ambientais. A especialista em Direito Ambiental Letícia Yumi Marques, porém, explicou anteriormente que o foco principal da legislação é a reparação de danos à natureza e não a prisão dos responsáveis. “Réu preso não repara o meio ambiente”, afirmou.
Após o rompimento da barragem de Brumadinho, o senador Randolfe Rodrigues (Rede) acertou com a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva a apresentação, na próxima segunda-feira, 28, de um projeto de lei para tornar hediondos “crimes ambientais, quando afetem gravemente ecossistemas e coloquem em risco a vida humana”.
A Superintendência da Policia Federal em Minas Gerais abriu inquérito para “apurar circunstâncias” do acidente. A Vale informou ainda não saber o que provocou o rompimento da barragem.
Se a resposta dificilmente virá da punição, é preciso que venha de uma maior regulação do setor, o que inclui obrigatoriedades tecnológicas. O governo federal poderá mudar as regras de licenciamento ambiental e fiscalização das barragens. “Parece que algo está falhando nesse licenciamento”, disse o general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. De acordo com o ministro, o governo fará novas auditorias para vistoriar barragens classificadas como “de risco.”
Com informações complementares da Agência Brasil e Agência Estado.
Fonte: EXAME
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