Aparece um novo ramo já extinto na árvore genealógica humana, como todos os outros que já dividiram o planeta conosco
Javier Sampedro
Para um paleontólogo do século XX, o santo graal era encontrar o “elo perdido”. A teoria dominante era que a evolução humana
desenhava um caminho linear desde nossos humildes ancestrais simiescos,
se erguendo passo a passo até adquirir a posição ereta e a palavra
articulada que nos caracteriza agora. Alguns passos intermediários eram
conhecidos – neandertais, Homo erectus, australopitecos – e só
restava preencher as lacunas: os elos perdidos de uma cadeia longa e
monótona. Mas a evolução raramente funciona assim. Costuma ter a forma
de uma árvore, e o novo Homo luzonensis é o último galho que a
coloca em evidência. Um ramo já extinto, como todos os outros que, até
há 50.000 anos, dividiram o planeta conosco, os Homo sapiens.
Os pés pequenos e primitivos do 'Homo
luzonensis' só podem ser explicados de duas formas. E a segunda
contradiz totalmente as evidências anteriores
De resto, tudo o que cerca a nova espécie encontrada nas Filipinas
não faz mais do que aprofundar o mistério. O tesouro fóssil consiste
por enquanto em sete dentes, três ossos do pé, dois da mão e um fêmur
quebrado. Não há um crânio, de modo que desconhecemos sua capacidade
cerebral e, como o fêmur está quebrado, também não é possível calcular
sua estatura de maneira confiável (a melhor suposição é um metro e
meio). Os ossos, que são de dois adultos e uma criança, revelam que o
homem de Luzón era um mosaico de traços primitivos e modernos. Os dentes
são pequenos, como em nossa espécie – por isso sua classificação no
gênero Homo –, mas suas mãos e pés se parecem mais com os primitivos
australopitecos, com um formato curvo que parece adaptado à vida
arbórea. Essa mistura de traços díspares lembra a do Homo floresiensis (apelidado de o hobbit),
outra espécie misteriosa encontrada em 2004, também no sudeste
asiático. Mas as semelhanças acabam aí: a espécie de Flores e a de Luzón
são claramente diferentes. Existem duas hipóteses alternativas sobre a origem do homem de Luzón. A primeira, que já foi colocada no caso do hobbit, é que se trata de um Homo erectus miniaturizado na ilha de Luzón. O Homo erectus, de acordo com todas as evidências, foi a primeira espécie humana que saiu da África,
há dois milhões de anos, e sua presença no sul da Ásia está bem
documentada. E também se sabe que as ilhas podem acelerar a evolução. A
miniaturização, por exemplo, pode ser explicada pelos principais
predadores terem ficado no continente, tornando sem sentido manter um
tamanho grande e custoso em termos energéticos. Mas no geral, as
populações pequenas e isoladas tendem a mudar por mera variação
genética, e isso poderia explicar o retorno a pés primitivos. A segunda hipótese é mais chocante, se for verdade. O homem de Luzón não viria do Homo erectus
e sim de um australopiteco. Isso explicaria imediatamente seus pés
primitivos, mas significaria que foi o antigo australopiteco, e não o
moderno Homo erectus, o primeiro a sair da África, o que contradiz todas as evidências anteriores. Só há uma forma de decidir entre as duas: encontrar mais fósseis. Se possível, com uma pitada de DNA.
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