Sim, as universidades públicas fazem pesquisas

Sim, as universidades públicas fazem pesquisas

*Sabine Righetti e Estêvão Gamba


O presidente Jair Bolsonaro (PSL) declarou recentemente que poucas universidades no Brasil fazem pesquisa. E, das que fazem, a maioria está na iniciativa privada. A informação está completamente incorreta.
O Brasil está entre os 15 países com a maior quantidade de estudos científicos publicados no mundo. Para se ter uma ideia, cientistas brasileiros lançaram cerca de 200 novos artigos acadêmicos diariamente em 2017. A maioria desses trabalhos está em instituições públicas.
USP, Unesp e Unicamp produzem, sozinhas, um terço de toda a ciência feita nas 198 universidades do país. Essas instituições lideram um grupo de universidades brasileiras intensas em pesquisa, que também conta com federais como UFRJ, UFMG e UFRGS. Nenhuma delas é privada.
Informações sobre a pesquisa científica no Brasil —como quantidade de artigos produzidos, produtividade per capita dos docentes, recursos captados para ciência e impacto dessas publicações acadêmicas— estão no RUF (Ranking Universitário Folha) desde 2012.
Pelo RUF 2018, sabemos, por exemplo, que a Unicamp tem os docentes e pesquisadores mais produtivos do país. Que os trabalhos acadêmicos dos professores da USP são os mais mencionados. Que a UFABC é a universidade brasileira com mais pesquisas inseridas internacionalmente.
Ao contrário do que afirmou o presidente, o RUF 2018 mostra que a maioria das 93 universidades particulares do país produz pouca ciência —as exceções são as instituições moderadas em pesquisa, como as PUCs Rio, Rio Grande do Sul e Paraná. Mais da metade dessas universidades sequer consegue manter insumos fundamentais para a atividade científica (como um terço dos professores em dedicação integral ou um número mínimo de programas de pós-graduação). Na prática, não poderiam, legalmente, ter status de “universidade”.
O RUF é produzido a partir de dados de bases nacionais e internacionais, informações de agências de fomento à ciência estaduais e federais e pesquisas de opinião. São informações oficiais —parte delas extraída do próprio governo.
A metodologia do RUF já foi escrutinada pelo Observatório de Rankings da Unesco (Ireg, na sigla em inglês). Um dos desafios atuais do levantamento é calcular a evasão de alunos e a empregabilidade dos egressos —informações que o próprio governo brasileiro, assim como as universidades, desconhecem.
Dados de rankings como o RUF podem auxiliar o desenho de políticas públicas. O governo chinês, por exemplo, com base no ranking universitário daquele país e em outras informações, dá um aporte de recursos públicos extras para nove universidades chinesas “de excelência”, como Pequim e Tsinghua.
No Brasil, não há iniciativas nesse sentido. E, ao que pese as declarações do presidente, parece que o governo desconhece a realidade do nosso ensino superior.

*Sabine Righetti é Pesquisadora-docente da Unicamp e coordenadora acadêmica e membro do conselho consultivo do RUF (Ranking Universitário Folha)
*Estêvão Gamba é Doutor em ciências pela Unifesp e estatístico responsável pelo RUF

Fonte: ATribuna

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