Os animais não conseguem acompanhar o ritmo das mudanças climáticas
Dezenas de espécies estão tentando adaptar-se, mas os primeiros dados indicam que em poucas há respostas
As mudanças climáticas
estão indo depressa demais para os seres vivos. As tentativas de
adaptação ocorrem em todas as espécies: com o aumento da temperatura, há
árvores que estão ocupando regiões cada vez mais para o norte ou
subindo cotas mais altas nas montanhas. Muitas aves estão antecipando
suas migrações e os peixes estão se deslocando para o norte. Os poucos estudos suficientemente longevos existentes mostram que poucas espécies tiram proveito do aquecimento global.
Um
grupo de pesquisadores, incluindo vários espanhóis, revisou as
publicações científicas que estudaram a resposta de diferentes animais
ao aumento de temperatura provocado pelas mudanças climáticas
em curso. Encontraram quase 5.000 estudos com dados de mais de 1.400
espécies nos quais observaram a conexão entre a evolução da temperatura e
mudanças em certas características ou padrões de comportamento de diferentes animais, como a antecipação do período de reprodução ou das migrações.
"Com
este banco de dados podemos dizer como a temperatura afetou as
características. Por exemplo, mostramos que, ao longo de muitos táxons
[um táxon é um grupo de organismos aparentados, que em uma determinada
classificação foram agrupados, atribuindo ao grupo um nome em latim, uma
descrição, se for uma espécie, e um tipo], o ritmo dos diversos eventos
biológicos foi sendo antecipado à medida que as temperaturas subiram
nas últimas décadas", explica a pesquisadora do Instituto Leibniz em um
e-mail para a pesquisa da Vida Silvestre e Zoológica (IZW, com sede em Berlim)
e principal autora do estudo, Viktoriia Radchuk. "Mas este conjunto de
dados não poderia nos dizer nada sobre se essas respostas das espécies
são adaptativas, isto é, se elas se traduzem em alguma vantagem de
adaptação, como um maior número de descendentes", acrescenta.
Para
determinar se uma mudança é adaptativa ou não é necessário trabalhar
durante décadas com as mesmas populações. Portanto, quase não existem
estudos que respondam a esta última questão. Só foram encontrados 71
trabalhos sobre menos de vinte espécies, principalmente aves.
Pesquisadores espanhóis da Estação Experimental de Zonas Áridas
(EEZA-CSIC) contribuíram com suas pesquisas com três dessas espécies: o
rolieiro (Coracias garrulus), o autillo (Otus scops) e a pega-rabuda
(Pica pica) na área de Guadix-Baza, no interior de Granada.
"A
primeira coisa que constatamos em nossa zona de estudo é que a
temperatura não aumentou de modo significativo durante os anos em que
estudamos essas espécies", diz o pesquisador da EEZA, Jesús Miguel
Avilés. "No entanto, observamos que os rolieiros e os autillos
anteciparam sua data de postura, a cada ano põem ovos antes, mas isso
não acontece com as pegas-rabudas, que não modificaram sua fenologia nos
últimos anos", acrescenta. Esta mudança da data de postura não traz
benefícios para os autillos, porque não têm mais descendentes quando se
reproduzem mais cedo, mas o rolieiro, sim, tem mais filhotes quando
antecipa a reprodução.
Muitas espécies anteciparam o fim da hibernação, das migrações ou da época da reprodução
O estudo, publicado na Nature Communications,
não encontrou confirmação de que as espécies estejam passando por
mudanças morfológicas por causa da pressão seletiva do aumento da
temperatura. Mas, sim, mudanças fenológicas, adaptações de padrões de
comportamento de seu ciclo de vida, em geral na forma de antecipação das
etapas desse ciclo, como o fim da hibernação ou o início do período de
acasalamento e reprodução. Essas adaptações, porém, não seguem o ritmo
das mudanças climáticas.
"Vemos que algumas
populações mudam bem devagar, por isso enfrentam o risco de extinção em
um espaço de tempo relativamente curto", diz em um email o biólogo
evolucionista da IZW, e coautor do estudo, Alexandre Courtiol.
Ainda
mais preocupante é o fato de que os dados disponíveis se referem a
espécies relativamente comuns e abundantes, como o chapim-real, a corça e
a pega-rabuda, que estão lidando melhor com o impacto climático. "As
respostas adaptativas entre as espécies mais raras ou ameaçadas ainda
precisam ser investigadas", diz Stephanie Kramer-Schadt, também da IZW, e
acrescenta: "Tememos que as previsões de manutenção das populações
dessas espécies-chave para a conservação sejam ainda mais pessimistas.”
Fonte: El País
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