terça-feira, 6 de agosto de 2019

Cientistas buscam decifrar enigma da ayahuasca e seu poder contra a depressão

Cientistas buscam decifrar enigma da ayahuasca e seu poder contra a depressão


Gustavo Monge. EFE Praga

6 ago 2019




Curandeira em um mercado de Iquitos, no Peru, em foto de 2005. EFE/Paolo Aguilar

A ayahuasca, consumida desde tempos remotos na Amazônia e considerada uma droga na Europa, pode ser o segredo para o desenvolvimento de novos tratamentos antidepressivos, segundo uma equipe de cientistas que viajará para o Peru para decifrar alguns dos enigmas deste ritual xamânico.
A expedição Neuron, liderada pelo neurologista tcheco Tomas Palenicek, está há dois anos se preparando para a viagem e estará no primeiro semestre de 2020 na floresta peruana, explicou à Agência Efe em Praga o neurologista Tomas Palenicek, do Instituto Nacional de Saúde Mental da República Tcheca.
Apesar de ter começado originalmente como um projeto tcheco, a pesquisa dirigida por Palenicek despertou o interesse de cientistas de outros países, como do brasileiro Eduard Schoenberg, que se somou à equipe agora internacional.
Um dos objetivos da pesquisa é medir, através de eletroencefalogramas (EEG), os efeitos do ritual da ayahuasca, uma planta que é ingerida em forma de bebida e que possui propriedades altamente psicoativas que os xamãs de muitos povoados da Amazônia usam para entrar em contato com seus respectivos deuses.
O chá é feito com o cipó-maririr (Banisteriopsis caapi) e folhas do arbusto chacrona (Psychotria viridis). O agente ativo alucinógeno, que produz visões, é a dimetiltriptamina (DMT).
"A ideia é obter escalas psicométricas antes e depois da cerimônia para detectar a mudança de estado de ânimo e se os efeitos são prolongados", explicou Palenicek.
Os cientistas esperam trabalhar com um mínimo de 18 voluntários, homens e mulheres, que, ao ingerir a bebida, não saberão se realmente contém o habitual agente psicoativo ou se trata-se de um placebo. O ritual, no qual participarão indígenas e xamãs locais, será filmado.
O pesquisador tcheco ressaltou que seu trabalho segue os passos de estudos anteriores, como os realizados pelo farmacólogo catalão Jordi Riba, que há 15 anos analisou com EEG o efeito da bebida em um grupo de voluntários.
No entanto, o enfoque de então, centrado nos efeitos químicos das substâncias bebidas, se deslocou agora para busca de uma aplicação concreta, sobretudo para um uso terapêutico para tratar diversas neuropatologias e, especialmente, para combater a depressão e a ansiedade.
A ideia, além disso, é ampliar a pesquisa além do que representa a ingestão da droga, ao questionar também o papel que desempenha o próprio ritual.
"O consumo da ayahuasca oferece experiências muito profundas que mostram os processos internos (do subconsciente), ao qual não temos acesso normalmente, e nos mostra o mundo de maneira diferente", destacou Palenicek.
Apesar de a substância ter um forte efeito alucinógeno, a pessoa que a bebeu mantém uma consciência clara: sabe que o que está vivendo se deve à ayahuasca ingerida.
O mundo de visões no qual entra é ao mesmo tempo um caminho introspectivo que pode oferecer experiências tanto positivas como também negativas.
"No caso das negativas, podem ser benéficas de certa foram: é uma maneira de trabalhar com nossos medos e isto nos pode ajudar", disse o especialista sobre os efeitos antidepressivos e contra a ansiedade da ayahuasca.
Os trabalhos da equipe de Palenicek fazem parte de uma série de pesquisas sobre a ayahuasca que estão sendo realizadas em diversos países.
Também há outras substâncias psicodélicas, como a ketamina e a psilobicina, sintetizada a partir de fungos alucinógenos, e que são administradas hoje em pacientes que sofrem de trauma, depressão, ansiedade e dependência de álcool e de cocaína.
Todas estas substâncias voltaram a ser pesquisadas na última década, após meio século de proibição pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
A ayahuasca, contra-indicada para pacientes com psicose ou com histórico familiar de esquizofrenia, possui também efeitos antiviciadores e antidepressivos parecidos aos da ketamina e psilobicina, mas para Palenicek oferece um elemento que as outras não têm.
"Trata-se de uma tradição contínua de uso de mil anos e de cerimônias que são realizadas há séculos", explicou o cientista.
Pessoalmente, Palenicek, que no seu trabalho experimentou psilobicina e a substância psicodélica semissintética LSD, preferiu não provar a ayahuasca fora do Amazonas.
"Não queria entrar nas cerimônias com 'pseudoxamãs' (...) Queria conhecer a cerimônia autêntica", declarou.
Isto o levou a viajar para os povoados brasileiros de Santa Rosa do Purus e Rio Branco, onde entrou em contato com comunidades indígenas e participou de vários rituais de ayahuasca.
"Foi muito impressionante", finalizou o cientista.





Fonte: EFE


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