Brasil estagna no PISA e expõe efeitos da desigualdade de renda e gênero na educação

Brasil estagna no PISA e expõe efeitos da desigualdade de renda e gênero na educação

Avaliação da OCDE, PISA mostra que desde 2009 país não tem evolução significativa nos indicadores de leitura, matemática e ciência
Alunos da Escola Sesc de Ensino Médio durante aula, na Barra da Tijuca, no Rio. Unidade teve notas acima da média nacional e de países desenvolvidos num PISA para escolas, aplicado no Brasil pela Fundação Lemann.
Alunos da Escola Sesc de Ensino Médio durante aula, na Barra da Tijuca, no Rio. Unidade teve notas acima da média nacional e de países desenvolvidos num PISA para escolas, aplicado no Brasil pela Fundação Lemann.

Foi curto, como um voo de galinha, o impulso que o Brasil teve nos indicadores de educação entre alunos de 15 anos. Dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes 2018 (PISA, em inglês), divulgados nesta terça-feira, apontam que no início do século, entre os anos de 2003 e 2018, o país conseguiu melhorar a performance dos estudantes desta faixa etária em leitura, matemática e ciências. Porém, a prometida arrancada não veio. Desde 2009, os resultados médios dos alunos não apresentaram uma melhora significativa: o país praticamente estagnou. A tendência se mantém há quase uma década, atestam os dados da prova mais recente, realizada no ano passado.
Em 2018, o país conseguiu 404 pontos em ciências, praticamente um empate em relação aos 401 pontos registrados na edição anterior da prova, 2015. A média global dos 79 países ou regiões econômicas que participaram da avaliação em ciências foi de 489 pontos. Em leitura o Brasil conseguiu 413 pontos, um leve avanço sobre os 407 pontos de 2015, mas muito abaixo dos 487 da média geral da OCDE. Em matemática, o país que havia perdido 12 pontos na edição passada teve uma recuperação. Conseguiu chegar a 384 pontos (contra 377 do exame anterior), mas ainda abaixo de seu melhor resultado, 389 pontos, registrado na prova de 2012. A média da OCDE em matemática foi de 489 pontos.


Realizado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o exame divulgado a cada três anos destaca que entre 2000 a 2012, o Brasil teve uma rápida expansão do ensino médio, adicionando mais de 500.000 estudantes à população total de jovens de 15 anos elegíveis para participar do exame. Esse crescimento é fruto de uma política de Estado que tornou obrigatória a educação básica para estudantes de 4 a 17 anos a partir de 2016. Anteriormente, só a matrícula de crianças no fundamental (6 a 14 anos) era prevista em lei. O mesmo movimento de expansão do ensino médio aconteceu em países como Indonésia, México, Turquia e Uruguai. A particularidade é que nesses países, o Brasil inclusive, o aumento no número de matrículas não sacrificou a educação oferecida, o que é esperado quando há uma grande entrada de estudantes no sistema.
A educação oferecida nesta etapa no Brasil, entretanto, manteve a mesma tendência de performance. Apenas 2% dos adolescentes tiveram os níveis mais altos de proficiência em pelo menos uma das disciplinas medidas pelo PISA 2018, a prova com resultados mais recentes. Enquanto isto, 43% dos alunos brasileiros obtiveram pontuação abaixo do nível mínimo em leitura, matemática e ciências. A média é maior que a obtida pelos países na lanterna da proficiência, ou seja, o grupo com os piores resultados —entre eles, 13% dos alunos estão abaixo do nível mínimo.
Nos níveis mais altos, os alunos podem compreender a leitura textos longos, lidar com conceitos abstratos e estabelecer distinções entre fato e opinião. Os estudantes também podem modelar situações complexas matematicamente, além de selecionar, comparar e avaliar estratégias para a solução de problemas. Além disso, são capazes de aplicar de forma criativa e autônoma seus conhecimentos sobre as ciências a uma ampla variedade de situações, incluindo as não familiares. Na média da OCDE, 16% dos estudantes atingem os níveis mais altos.
Cerca de 1% dos alunos brasileiros obteve notas altas em matemática. Paralelamente, seis países ou economias asiáticas tiveram a maior parcela de estudantes no topo desta disciplina: as quatro províncias chinesas Pequim, Xangai, Jiangsu e Zhejiang tiveram 44% de estudantes em destaque nesta disciplina, seguidas por Cingapura (37%), Hong Kong (29%), Macau (28%), Taipé Chinês (23%) e Coreia do Sul (21%).

Situação socioeconômica
A desigualdade socioeconômica é um grande divisor de águas nestes resultados. Em 2018, alunos brasileiros mais ricos superaram os pobres em leitura em 97 pontos —em 2009, a diferença de desempenho nesta área entre os dois estratos socioeconômicos foi de 84 pontos no Brasil. A boa notícia é que cerca de 10% dos estudantes desfavorecidos conseguiram pontuar entre os índices mais altos do desempenho em leitura, o que indica, segundo o relatório do PISA, que a desvantagem econômica não é necessariamente o que determina o destino dos estudantes.
O otimismo da OCDE, no entanto, não se sustenta nas próprias análises da organização quanto ao potencial real de futuro desses estudantes. Cerca de 1 em cada 10 alunos desfavorecidos de alto desempenho não tem expectativa de concluir o ensino superior. Esse indicador muda quando relacionado aos estudantes mais favorecidos: apenas 1 em cada 25 alunos não deve terminar a faculdade.

Diferença de gênero
As meninas mantêm a liderança nos indicadores de leitura, com uma diferença média de performance de 26 pontos em relação aos meninos. Por outro lado, os meninos superaram as meninas em matemática em 9 pontos. Já nas ciências, meninas e meninos têm desempenho semelhante no Brasil.
De acordo com o relatório, entre o estudantes de alto desempenho em matemática ou ciências, cerca de um em cada três meninos no Brasil espera trabalhar como engenheiro ou profissional de ciências aos 30 anos. Apenas uma em cada cinco meninas espera seguir essas carreiras.
Dentre as meninas de alto desempenho, cerca de duas em cada cinco esperam trabalhar em profissões relacionadas à saúde ―o mesmo percurso deve ser seguido por cerca de um em cada quatro meninos com desempenho semelhante. Apenas 4% dos meninos e quase nenhuma menina esperam trabalhar em profissões relacionadas à tecnologia das informação no Brasil.

Fonte: El País

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