Espaçonave entra no Sol pela primeira vez
Sonda ‘Parker’ mergulha na atmosfera solar, ambiente a um milhão de graus dominado por ventos de 150 quilômetros por segundo
Nuño Domínguez
05 Dec 2019 - 11:54 BRT
Pela primeira vez na história uma nave espacial entrou na atmosfera do Sol e sobreviveu para contar. Na quarta-feira foram publicados os primeiros resultados científicos reunidos pela Sonda Solar Parker da NASA
durante suas duas primeiras aproximações ao astro. Os dados revelam uma
estrela muito mais violenta e enigmática do que se pensava.
A
principal missão da Parker é entender por que as camadas mais
superficiais da atmosfera solar, a coroa, podem chegar a temperaturas de
um milhão de graus enquanto muito mais para dentro, na superfície, são
somente de 5.000 graus. Resolver esse enigma é essencial para entender o
comportamento da estrela e seu vento solar, uma rajada de partículas
subatômicas carregadas que vai em todas as direções. As tempestades
solares podem ser uma ameaça aos astronautas e causar danos importantes
na fiação elétrica e nas comunicações por satélite.
A
sonda explorou a área a 24 milhões de quilômetros da superfície, seis
vezes mais próxima do que a Terra está do Sol. A espaçonave segue uma
órbita muito alongada de modo que, após se aproximar ao máximo do Sol,
se afasta até ultrapassar Vênus,
o segundo planeta mais próximo ao astro. Além disso tem um escudo
térmico que está sempre de frente para o Sol e que é capaz de suportar
temperaturas de 1.400 graus. Do outro lado dessa couraça os instrumentos
científicos se mantêm a 30 graus.
Os primeiros resultados da missão foram publicados na quarta-feira em quatro estudos na revista científica Nature. Um deles demonstra que o fluxo de partículas é muito mais rápido do que havia sido observado.
“Verificamos que o vento solar avança formando enormes ondas que, em
questão de minutos, duplicam sua velocidade chegando aos 150 quilômetros
por segundo”, diz Justin Kasper, físico da Universidade de Michigan e
coautor de vários dos estudos publicados. “É algo nunca visto até
então”, frisa o pesquisador.
As rajadas de vento solar
“vêm em grupos e parecem ter uma estrutura coerente”, afirma Kasper. De
acordo com sua equipe, esses padrões podem ocorrer pelo fato do Sol
gerar um campo magnético que marca o caminho seguido pelas partículas e
as acelera. Essa espécie de rodovia tem formato de S, de modo que os
elétrons e os prótons carregados não viajam em linha reta, e sim fazendo
esses em seu cada vez mais rápido caminho em direção à Terra.
Da
mesma forma que na atmosfera terrestre, o plasma de partículas
carregadas da coroa solar gira no mesmo sentido que a estrela. Em
teoria, a velocidade de rotação deveria diminuir à medida que o plasma
se afasta da superfície, mas os dados da Parker mostram que, nas camadas
mais superficiais da coroa, o plasma vai “20 vezes mais rápido do que
deveria de acordo com as previsões”, diz Kasper. Por enquanto não há
muitas respostas sobre os fenômenos observados, reconhece o físico, mas
sim a esperança de que nos próximos anos possam ser entendidos, até
mesmo prognosticados.
“Estamos falando de uma região do
sistema solar que nunca havia sido explorada dessa forma e, somente por
isso, esses estudos significam um feito”, ressalta Javier Rodríguez,
destacado cientista da Missão Solar Orbiter (SolO) da Agência Espacial Europeia
e membro da equipe de coordenação com a missão da NASA. Em pouco mais
de um mês a Parker usará a gravidade de Vênus para mergulhar mais
profundamente na atmosfera do Sol. Irá fechando sua órbita até alcançar
dentro de cinco anos sua maior aproximação, a 6,9 milhões de quilômetros
da superfície. Quando isso ocorrer, suas observações terão se somado às
da Solar Orbiter, uma missão europeia com quantidade bem maior de
instrumentos que será lançada em fevereiro do ano que vem e observará o
Sol a uma distância de 42 milhões de quilômetros. Para Rodríguez é muito
cedo para saber se o observado pela Parker é a regra ou um fenômeno
pontual, algo que será confirmado primeiro durante as próximas órbitas
solares e depois com as observações da Solar Orbiter. A sonda europeia
será a primeira a observar os polos do astro, invisíveis da Terra e que
são fundamentais para entender os ciclos solares de atividade magnética,
que duram 11 anos. Com os dados reunidos por essas duas espaçonaves
talvez seja possível começar a explicar o mistério de nossa estrela e o
de milhões de astros como ela.
Fonte: El País
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