Estudo confirma utilidade dos corticoides contra a covid-19 e descarta a dos antivirais
Trabalho
da Sociedade Espanhola de Farmácia Hospitalar (SEFH) também aponta que a
hidroxicloroquina pode ter um efeito protetor contra a doença em doses
mais baixas
Emilio de Benito
Madri - 20 jun 2020 - 13:34 BRT
O uso de corticoesteroides a partir da primeira semana de hospitalização reduz em até 50% a mortalidade pela covid-19,
enquanto os antivirais (lopinavir e ritonavir) não estão associados a
uma maior sobrevivência. Estas são as duas conclusões principais de um
estudo realizado por membros da Sociedade Espanhola de Farmácia
Hospitalar (SEFH). Jesús Sierra, coordenador do Cadastro Espanhol de
Resultados da Farmacoterapia contra a covid-19 da SEFH, explica que se
trata de um trabalho observacional, ou seja, eles não orientaram aos
médicos a fazerem nada, apenas compilaram o que acontecia no dia a dia
de 174 hospitais. Mas esperam que o estudo sirva para estabelecer
hipóteses de tratamento e em ensaios já de duplo-cego (com um grupo de
voluntários tomando o medicamento, e outros usando um placebo).
Este primeiro trabalho, que foi enviado para publicação à revista Annals of Internal Medicine,
acompanhou a evolução de 5.386 pacientes que completaram seu
tratamento. Isso o transforma em um dos maiores trabalhos sobre a covid
até o momento. Neles – todos os casos suficientemente graves para exigir
hospitalização – a mortalidade após 28 dias era de 17,8%.
O
estudo conclui que o uso de corticoesteroides (entre eles a
dexametasona, mas também a metilprednisolona) aumenta em 50% a chance de
sobrevivência, se administrado a partir da primeira semana de
hospitalização. Embora o trabalho só procure as relações significativas
estatisticamente, seu coordenador explica que, de fato, na Espanha se
usou muito mais a metilprednisolona, e que não se observou diferença
entre uns corticoides e outros. Admite que em muitos casos estes
imunossupressores foram usados desde o primeiro dia, e que só em 6% dos
casos eles foram pautados depois da primeira semana de internação, que é
quando a infecção costuma se agravar com um forte aumento do processo
inflamatório, que é a indicação desses medicamentos.
O
trabalho também menciona um efeito protetor similar do tocilizumab, um
fármaco biológico dirigido especificamente às citocinas, explica Sierra,
que são as moléculas envolvidas nos processos inflamatórios graves e
descontrolados, as chamadas tempestades de citocinas.
Estes
três medicamentos – dexametasona, metilprednisolona e tocilizumab –,
junto à anakinra, a ciclosporina e o salirumab, são parte do conjunto de
imunorreguladores que figuram em uma disposição publicada este sábado
no diário oficial espanhol, que os considera essenciais para a luta
contra a epidemia. Isso obriga os governos regionais a informarem
semanalmente seus estoques, para assegurar seu fornecimento.
“Curiosamente, não tenho conhecimento de que tenha sido usada a
ciclosporina”, diz Sierra.
Heparina
Também
foi encontrada no estudo uma diminuição de 30% na mortalidade com o
emprego da heparina. Esse anticoagulante poderia servir porque um dos
efeitos da infecção pela covid é um aumento das tromboses (formação de
coágulos). Já em maio, um grupo do Centro Nacional de Pesquisas
Cardiológicas (CNIC, na sigla em espanhol), dirigido pelo Valentín
Fuster, publicou um estudo sobre os benefícios dos anticoagulantes nos
pacientes internados com Covid. Esse medicamento também está na lista de
medicamentos essenciais do Ministério da Saúde.
Entre as conclusões do estudo está que a hidroxicloroquina tem um efeito protetor contra a doença. Esse medicamento foi descartado pela Organização Mundial da Saúde (OMS)
e não figura na lista da Saúde espanhola, mas Sierra explica que os
testes feitos, como o Recovery, que concluiu que o produto aumenta a
mortalidade, utilizavam o fármaco em doses muito mais altas que as
empregadas nos hospitais espanhóis. “Em 10 dias administravam ao
paciente 9,6 gramas, enquanto que a média na Espanha foi de 3,6 gramas
em sete dias”, afirma, e destaca que o produto é um “anti-inflamatório
muito razoável”. De fato, o trabalho que levou a OMS a descartar o uso
desse produto foi muito questionado, e a própria sociedade de farmacêuticos hospitalares mantém um ensaio sobre seu emprego como fármaco preventivo para profissionais da saúde.
No
trabalho, que reúne o que era a prática nos hospitais espanhóis,
chega-se a outra conclusão, como que acrescentar a antivirais (ritonavir
e lopinavir) à hidroxicloroquina não melhora o resultado. “Como com a
gripe, parece que os antivirais não funcionam”, diz Sierra. Estes dois
produtos, usados contra o HIV, não figuram na lista da Saúde, mas estão
sendo investigados sob com patrocínio da OMS no ensaio Solidarity, “Só
que em doses muito mais altas” que as usadas nos hospitais espanhóis,
diz Sierra.
O mesmo acontece com a combinação de
hidroxicloroquina e azitromicina (um antibiótico), que nos dados do
registro da SEFH não parece oferecer benefícios. No princípio da
epidemia, foram usados muitos antibióticos para evitar pneumonias
secundárias por bactérias, mas depois foram sendo retirados, ao se
constar que eram desnecessários. A OMS recomendou reduzir seu uso ao
máximo para evitar o surgimento de resistências, e calcula-se que só 8%
dos afetados pela covid precisem disso. O fármaco, entretanto, está na
lista do Ministério da Saúde da Espanha, assim como outro
antimicrobiano, o cefditoreno.
A relação de medicamentos
essenciais do ministério inclui, além disso, broncodilatadores –
“relacionados com o tratamento de qualquer insuficiência respiratória”,
segundo Serra – como o brometo de ipratropio e o salbutamol. Também há
muitos fármacos relacionados com a sedação e a anestesia (clonazepam,
dexmedetomidina, diazepam, fentanilo, haloperidol, levomepromazina,
midazolam, propofol e remifentanilo); com o suporte ventilatório
(cisatracúrio, rocurônio) e o suporte vital (dobutamina, dopamina e
norepinefrina).
Fonte: El País
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