O incrível lago artificial para surfistas que pode produzir até mil ondas por hora
Claire MarshallRepórter de meio ambiente da BBC News
29 outubro 2019
Direito de imagemGlobal ShotsParque The Wave custou 26 milhões de libras
Dez anos depois de
ser idealizado, um gigantesco lago artificial capaz de produzir ondas
iguais às do mar foi inaugurado nesta semana em Bristol, no Reino Unido.
O complexo, chamado The Wave (A Onda), custou 26 milhões de libras e pode gerar até mil ondas por hora. Ele
cria desde pequenas ondas, para quem está aprendendo a surfar, até
rápidas e grandes ondas que formam tubos, para surfistas experientes. Os
donos dizem que o complexo funciona com energia 100% renovável e
afirmam que ele é uma "sala de aula perfeita" para ampliar a
conscientização de questões ambientais como poluição por plástico e
emissões de carbono. Direito de imagemGlobal Shots /DivulgaçãoO complexo ocupa uma área de mais de 300 mil metros quadrados
O complexo ocupa uma área de 300 mil metros quadrados. Só o lago tem 180 metros de comprimento e 200 de largura.
Estreia radical
As primeiras pessoas a surfar nas ondas do lago foram selecionadas entre centenas de candidatos. O complexo também foi planejado para tornar as ondas acessíveis até para pessoas com deficiências severas. Entre
os surfistas que inauguraram o complexo estavam Marshall Janson, um
jovem que perdeu as mãos e pernas quando teve meningite, Claire Moodie,
que criou uma ONG para combater a poluição por plástico, e um grupo de
crianças. Direito de imagemGlobal ShotsAs ondas do complexo imitam ondas que quebram sobre recifes de corais
O parque foi idealizado pelo empresário Nick Hounsfield. "Temos
um grande oportunidade de tirar as pessoas, especialmente as crianças,
da frente do computador, levá-las ao ar livre, fazê-las interagir com a
natureza, e melhorar a saúde e o bem estar físico e mental das pessoas",
diz ele.
Preservação e energia renovável
Hounsfield diz que no começo se preocupava com a possibilidade de receber críticas negativas de ambientalistas. "Tenho
amigos que são experientes militantes pelo meio ambiente, e eu me
preocupava que construir algo tão artificial assim, como se isso de
alguma forma desvalorizasse [o projeto]", diz ele. "Mas eles se
mostraram entusiasmadas com o The Wave, porque será a maneira perfeita
de levar a mensagem [sobre a importância da preservação ambiental] de
uma forma que atraia as pessoas." Direito de imagemJavi Munoz/Divulgação
Nick Hounsfield afirma que o esporte tem um poder de renovar a vida das pessoas
"Existe uma grande falta de conexão entre as pessoas
que moram em cidades e muitas vezes não entendem o impacto das escolhas
que fazem no dia a dia no ambiente costeiro", diz Hounsfield. "Tudo
afeta, desde a forma como lidamos com esgoto às nossas escolhas de
produtos descartáveis." As construções do complexo são feitas de
madeira renovável e protegidas do frio com uma fibra de madeira
sustentável. Todos têm painéis solares. O presidente do parque
aquático, Craig Stoddart, diz que a empresa gasta 100 mil libras a mais
por ano para usar energia renovável. Direito de imagemImage CabinO campeão de surfe Jayce Roberts foi o primeiro surfista profissional a testar as ondas
Cerca de 16 mil árvores estão sendo plantadas no
local, campos de flores e áreas alagadas também estão sendo criados — a
ideia é ter um espaço para aprendizado ao ar livre. "Minha missão
era tirar crianças da cidade e levá-las para brincar na natureza", diz o
paisagista Ian Richardson. "E também para os mais velhos, dar a eles
espaço para estarem em um ambiente natural." Direito de imagemGlobal Shots/DivulgaçãoO objetivo dos criadores é o local ser totalmente
autônomo em energia elétrica e poder se desligado da rede elétrica em
seis anos
O The Wave foi construído em uma antiga área agrícola, de acordo com Richardson, que tinha "pouca diversidade e ecologia". "Tivemos
de prestar atenção a onde o lago estava e como ele se relacionaria com o
paisagem. Por exemplo, o que poderíamos fazer com todo o solo que
tiramos [do local], como poderíamos usá-lo para melhorar a
biodiversidade e o ambiente", diz ele. Direito de imagemImage Cabin/DivulgaçãoO plano é que o time do Reino Unido treine no local
para a Olimpíada de Toquio — quando o surfe será um esporte olímpico
O parque The Wave está dentro de uma área de
conservação da floresta de Avon. "Em vez de criar um uma 'ilha' de
natureza, eu queria conectá-la com o ambiente, para permitir que a flora
e a fauna se espalhem", diz Richardson. As aulas para iniciantes custam cerca de 55 libras (R$ 284).
Como uma onda no mar
No
oceano, as ondas podem se formar a milhares de quilômetros do local
onde elas quebram, já mais próximo à praia. Elas surgem quando o vento
passa pela superfície da água, criando ondulações que vão crescendo ao
se afastar do ponto de surgimento. A onda estão muda de forma, atinge um pico e quebra ao chegar em águas mais rasas. O
tipo de onda depende do tipo de solo marítimo, e o fundo do lago do The
Wave foi projetado para criar ondas que imitam as que quebram sobre
recifes de corais. Isso significa que é a onda mais próxima de uma onda natural do oceano quanto a física permite. Direito de imagemGlobal ShotsProjeto também inclui aulas para iniciantes no surfe
Hounsfield começou o projeto com muito pouco
dinheiro. "Foram dois anos e meio de reuniões difíceis para conseguir
encontrar o local, conseguir permissão para construir e conseguir o
financiamento", diz. Críticos do projeto dizem que ondas
regulares, idênticas às naturais, mas produzidas em lagos para
surfistas, dão às pessoas uma falsa sensação de segurança no oceano.
Alguns surfistas também dizem que isso vai levar à superlotação de
praias de surfe. Hounsfield diz que é possível que haja mais
surfistas, mas que eles vão entender o esporte melhor e ser mais
conscientes ecologicamente — e mais preocupados com segurança na água.
Por exemplo, eles vão ensinar as pessoas a como sair das perigosas
correntes de retorno. E lagos de surfe são um tendência no país — os criadores assinaram um acordo para criar um novo parque da marca em Londres. Fonte: BBC
Como a invenção do laser gerou um conflito que durou 30 anos
BBC
27 outubro 2019
Direito de imagemGetty ImagesO laser é uma das invenções mais revolucionárias do século 20
Quem é o inventor de algo: o autor da ideia inicial, quem recebe a patente ou quem acaba transformando essa ideia em realidade?
No
caso da invenção dos raios laser, até hoje, não há uma resposta clara a
esse respeito: se você pesquisar, encontrará várias pessoas descritas
como 'inventoras do laser'. Tudo começou com uma sugestão feita por Albert Einstein em uma
pesquisa intitulada "Sobre a teoria quântica da radiação", em 1917,
quando ele deu as bases para produzir o raio de luz que usamos hoje –
seja em delicadas cirurgias, ou para medir a distância entre a Terra e a
Lua. A partir de então, vários cientistas de diferentes partes do mundo começaram a explorar o que Einstein havia antecipado. Mas foi somente nas décadas de 1940 e 1950 que os físicos encontraram uma maneira de colocar o conceito em prática.
Um dia em 1957
Na noite de 13 de novembro de 1957, um cientista chamado Gordon Gould não conseguia dormir em sua cama em Nova York.
Direito de imagemGetty ImagesGordon Gould foi o responsável por cunhar a palavra 'laser'
De repente, uma ideia lhe veio à cabeça. Ele pegou um caderno e começou a preenchê-lo com esboços, equações e cálculos. Depois
de uma semana de intenso trabalho, com seu caderno em mãos, ele foi a
uma loja de doces, na qual pediu ao proprietário – que também era
notário público – para selar cada uma das 9 páginas nas quais estava
registrado o produto de seu trabalho. O título que ele escolheu
foi "Alguns cálculos aproximados sobre a viabilidade de um LASER:
amplificação de luz por emissão estimulada de radiação". Ele cunhou a palavra, que era um acrônimo de "Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation".
Um outro dia em 1957
Simultaneamente, também em Nova York, um físico de 34 anos chamado Charles Townes pensava intensamente sobre o mesmo assunto.
Direito de imagemGetty ImagesCharles Townes, em 1964, recebendo o Prêmio Nobel de Física
Em outro dia em 1957, ele discutiu suas ideias com
um colega, amigo e cunhado Arthur Schawlow, que encontrou a chave para
fazer um laser: colocar os átomos que ele queria estimular em uma
cavidade longa e estreita com espelhos refletivos para fortalecer o
processo de emissão de fótons (partículas de luz), produzindo uma reação
em cadeia. Mas acontece que essa ideia foi a mesma que Gordon Gould teve. Só
que, diferentemente de Gould, Townes e Schawlow sabiam que, para
patentear algo nos Estados Unidos, você não precisava efetivamente
fabricar sua invenção: bastava provar que era possível fabricá-la. Então foram eles que a patentearam.
Três décadas de disputas
Nas décadas seguintes, indústrias inteiras foram construídas em torno do laser. Em
1964, Townes dividiu o Prêmio Nobel de Física com os russos Aleksandr
M. Prokhorov e Nicolai G. Basov pelo desenvolvimento dessa invenção.
Direito de imagemGetty ImagesArthur Schawlow posando com laser em um laboratório em Stanford, Estados Unidos
Schawlow ganhou o mesmo prêmio em 1981 por seus avanços no uso de lasers. Enquanto isso, embora Gould tivesse sido o primeiro a descobrir como fazer um laser e cunhar o termo, ninguém acreditava nele. Foram
necessários 30 anos, muitas batalhas judiciais, milhões de dólares e
uma luta épica com o governo dos Estado Unidos e a indústria do laser
antes de alcançar o reconhecimento de uma das invenções mais
revolucionárias do século 20.
Uma dívida enorme
O
problema era que, se o que Gould alegava fosse declarado válido, todos
os que haviam fabricado ou usado um laser anteriormente lhe seriam
devedores. E quanto mais tempo levasse para o caso ser decidido, maior
seria a dívida.
Direito de imagemGetty ImagesGould depois de vencer sua longa batalha judicial pelos direitos sobre o laser
Em 1977, 20 anos após o caderno de Gould ser
registrado, o Escritório de Patentes dos EUA declarou que ele primeiro
teve a primeira ideia de um tipo de laser, o que lhe dava o direito de
cobrar royalties de todas as empresas que o fabricavam. Em 1979,
ele venceu outra batalha, e a decisão final veio em 1985, quando a
Justiça negou provimento aos casos de reexame da patente de Gould. Ele tinha vencido. E, embora tivesse apenas 20% dos direitos sobre suas patentes, ele se aposentou com US$ 46 milhões.
O primeiro
Desta forma terminou uma das maiores guerras de patentes da história.
Direito de imagemGetty ImagesTheodore Maiman ao lado da máquina que construiu
Em 2013, os Estados Unidos mudaram seu sistema de
conceder a patente ao primeiro a inventar para entregá-la ao primeiro a
arquivar a ideia, em parte para evitar casos retroativos de décadas,
como o de Gould. Foi a última nação industrializada a mudar para esse sistema. E
deve-se notar que nem Gould, nem Townes, nem Schawlow foram os
primeiros a fabricar a máquina a laser: quem conseguiu torná-la
realidade foi outro físico chamado Theodore Maiman, em 1960. Então, ele deveria levar o título de inventor do laser?
Um processo, não um ato
"Uma
opinião comum entre os historiadores de ciência e tecnologia é que
geralmente é um erro tentar vincular uma invenção ou uma descoberta
científica a um único indivíduo ou instante no tempo", escreveu a
historiadora Joan Lisa Bromberg, autora de "O Laser nos Estados Unidos,
1950-1970 ".
Direito de imagemGetty ImagesO laser foi e continua sendo uma parte importante da
ficção. Em uma famosa cena de "007 contra Goldfinger", o bandido o usa
para ameaçar James Bond, como mostra imagem à esquerda
Ela citou Hugh GJ Aitken, professor da Universidade
Americana de Amherst, em Massachusetts, que escreveu: "Nós tendemos a
pensar na invenção como um ato, ao invés de um processo devido ao viés
incorporado às nossas leis de patentes". "Para garantir os
direitos de propriedade de uma nova descoberta, é importante poder
estabelecer prioridades ao longo do tempo... No entanto, esse viés não
deve corromper nossas interpretações históricas... a invenção (é) um
processo com uma duração considerável no tempo, em que muitos indivíduos
contribuem de maneira substancial." O caso da invenção do laser é um bom exemplo disso. Para
Bromberg, nem Gould, nem Townes, nem Schawlow, nem Theodore Maiman
fabricaram um laser por conta própria. O laser foi criado devido a todas
as suas contribuições – e também às de outros cientistas.
Direito de imagemGetty Images'Finalmente, deve-se enfatizar que o uso de um raio
laser para fins destrutivos a longas distâncias é totalmente irrealista.
O 'raio da morte' é e continua sendo um mito', disse o professor B.
Edlen, do comitê do Nobel, ao entregar o prêmio de Física em 1964
Apesar da longa disputa, o laser rapidamente
capturou a imaginação do público, talvez por causa de sua semelhança com
os "raios de calor" da ficção científica. Mas as aplicações práticas
levaram anos para serem desenvolvidas. Uma jovem física chamada
Irnee D'Haenens, enquanto trabalhava com Maiman no laser, brincou que o
dispositivo era "uma solução em busca de um problema"... e que
finalmente encontrou vários. Mas a verdade é que hoje vivemos em um mundo em que o laser é tão onipresente que é difícil imaginá-lo sem ele. Fonte: BBC
Por que o Homem Vitruviano de Leonardo Da Vinci é tão icônico?
Redação BBC News Mundo
29 outubro 2019ar
Direito de imagemGetty ImagesO desenho interpreta as teorias da proporção de corpo do arquiteto Vitrúvio
O famoso Homem
Vitruviano, de Leonardo da Vinci, finalmente viajou a Paris, apesar das
tentativas de impedir que o desenho saísse da Itália.
Uma corte
italiana determinou que a obra — tem que cerca de 530 anos de idade —
podia ser transportada ao Museu do Louvre em Paris, onde agora faz parte
de uma mostra que comemora os 500 anos da morte do grande
renascentista. A organização sem fins lucrativos Italia Nostra se opunha a seu
traslado, por considerar que o desenho, que normalmente se encontra em
uma sala de temperatura controlada na Galeria da Academia de Veneza, era
muito frágil para sair dali. O Homem Vitruviano é uma das obras
mais famosas de Da Vinci, e muitos temiam que sofresse algum tipo de
dano durante a viagem ou durante a exposição na capital francesa. A obra
é um desenho de tinta sobre papel. Mas por que esse desenho é
considerado uma obra icônica do pintor, anatomista, arquiteto,
cientista, inventor e filósofo florentino?
Ideia no papel
Na
opinião de Joanne Allen, professora do Departamento de Arte da
Universidade Americana em Washington, esse é um "desenho muito incomum
para Leonardo". "É
um desenho com tinta muito bem acabado, feito para expressar uma ideia
intelectual concisa, não um esboço de uma observação científica ou um
desenho preparatório para uma pintura", explica Allen à BBC. Essa
ideia expressa por Da Vinci está baseada em um dos textos do antigo
arquiteto romano Vitrúvio (80-70 a. C.-15 a. C), que relacionou as
medidas e o desenho do corpo humano com a arquitetura. Em seu
tratado de arquitetura, Vitrúvio expôs suas teorias sobre as proporções
humanas, que afirma que a proporção ideal de uma figura humana deve
entrar em um círculo e em um quadrado. Direito de imagemGetty ImagesDiferentemente de outros desenhos de Da Vinci, o Homem Vitruviano expressa uma ideia concisa, segundo Allen
"Se um homem fica de costas, com as mãos e pés
estendidos e um par de compassos centrados em seu umbigo, os dedos de
seus dois pés e das mãos tocarão a circunferência do círculo desenhado",
disse Vitrúvio. "E assim como o corpo humano produz um contorno circular, também será possível encontrar uma figura quadrada a partir dele." Da
Vinci, no entanto, acomodou cientificamente o ponto central do círculo
fora do umbigo para assegurar que a teoria funcionasse. Isso, diz Allen, "não havia sido feito antes de uma maneira tão convincente". "Leonardo
utilizou duas formas perfeitas — o quadrado e o círculo — que
historicamente simbolizavam a Terra e o Paraíso, respectivamente, e
colocou o homem no centro." Para Allen, os temas da perfeição e da
unidade fazem que esse desenho seja um dos trabalhos mais importantes
do Renascimento italiano. Fonte: BBC
Por que sacolas de papel ou algodão podem ser tão ruins para o ambiente quanto as de plástico
BBC
30/10/2019r
Direito de imagemGetty ImagesSacolas de papel e algodão são menos sustentáveis do que pensamos?
Pense na última vez que você recebeu uma sacola com suas compras — era de plástico, papel ou algodão?
Não importa. Todas
são ruins para o meio ambiente, e especialistas dizem que, para começo
de conversa, você não deve nem comprar uma sacola nova (mais sobre isso
adiante). É isso mesmo — até sacolas de papel e de algodão. Na
realidade, elas podem ser até pior para o meio ambiente do que sacolas
de plástico que são recicladas. O problema é que, quando pensamos
sobre sacolas sustentáveis, só focamos no que vai acontecer com ela
depois de sua vida útil, mas esquecemos dos custos de fabricar uma
sacola, em primeiro lugar. Para calcular o custo ambiental verdadeiro, precisamos levar em consideração:
Quanta energia é usada para fazer a sacola durante sua produção;
Quantas vezes ela pode ser reutilizada;
O quão fácil é reciclá-la;
Qual é a rapidez de sua decomposição se é jogada fora.
Quatro vezes mais energia
Direito de imagemGetty ImagesUma quantidade considerável de plástico foi encontrada no oceano nas décadas recentes
Fazer sacolas de papel e algodão tem um custo ambiental. De
acordo com um estudo de 2011 pela Assembleia da Irlanda do Norte,
gasta-se "quatro vezes mais energia para manufaturar uma sacola de papel
em relação do que se gasta na fabricação de uma sacola de plástico". Diferentemente
de sacolas de plástico (que são produzidas por produtos restantes de
refinamento de óleo, de acordo com o estudo), sacolas de papel requerem
que florestas sejam desmatadas para sua produção. O
processo de manufatura, de acordo com a pesquisa, também usa muita água
e produz uma alta concentração de químicos tóxicos, em comparação com o
que acontece na manufatura de sacolas plásticas de uso único.
Quantas vezes você precisa reutilizar cada tipo de sacola?
Fonte: Agência Ambiental do Reino Unido
"Elas
também são mais pesadas", diz Margaret Bates, professora de gestão
sustentável de resíduos na Universidade de Northampton, no Reino Unido. "Então, dependendo do que são feitas, têm um impacto ambiental extra em seu transporte até às lojas." Alguns
dos danos ambientais são mitigados pelas novas florestas que repõem as
árvores perdidas e que ajudam a compensar o impacto nas mudanças
climáticas, porque as árvores sequestram carbono da atmosfera.
Carbono na fabricação
Temos
também sacolas de algodão, consideradas a pior entre as três. Elas usam
mais carbono em sua fabricação e demandam muita água. Além disso, diz Bates, "algodão tem um cultivo intenso, então temos as mesmas preocupações que temos com 'fast fashion'". Em
2006, a Agência Ambiental do Reino Unido examinou uma gama de sacolas
feitas de diferentes materiais para encontrar quantas vezes elas
precisam ser reusadas para diminuir seu potencial de impacto no
aquecimento global em relação a sacolas de uso único. O estudo
concluiu que sacolas de papel precisam ser reusadas ao menos três vezes,
uma vez menos que as sacolas de plástico (quatro vezes). Do outro
lado do espectro, a Agência Ambiental concluiu que sacolas de algodão
precisam ser reusadas mais vezes —131 vezes. Isso porque muita energia é
usada para produzir e fertilizar o algodão. Mas mesmo que sacolas
de papel precisem de menos reusos, há uma consideração prática a se
fazer: vai durar tempo o suficiente para sobreviver ao menos três idas
ao supermercado? Sacolas de papel não são tão duráveis como outras
sacolas, tendo mais probabilidade de rasgar, especialmente se ficarem
molhadas. Direito de imagemGetty ImagesA família do homem que criou sacolas de plástico diz que elas foram feitas para ajudar o planeta
Em sua conclusão, a Agência Ambiental diz que "é
improvável que a sacola de papel seja usada a quantidade de vezes que
precisa por causa de sua durabilidade baixa". Sacolas de algodão, por outro lado, são as mais duráveis e têm, portanto, uma vida útil mais longa. Apesar
de sua baixa durabilidade, uma vantagem do papel é que decompõe muito
mais rápido que plástico, então tem menos proabilidade de representar um
risco para a natureza. Sacolas de plástico podem levar entre 400 a
mil anos para decompor, e viraram um símbolo de problemas causados pela
poluição por plástico. Mas de acordo com a família do homem que
criou o saco plástico, Sten Gustaf Thulin, seu design foi justamente
para ajudar o planeta e ele ficaria chocado e triste se soubesse o que
ele se tornou. "Para o meu pai, a ideia de que as pessoas simplesmente jogariam essas sacolas fora seria bizarro", diz seu filho, Raoul Thulin. Direito de imagemGetty ImagesA resposta para tudo é reutilizar sua sacola o máximo possível, não importa o tipo que for
Sten inventou o saco plástico na Suécia em 1959.
Naquela época, as pessoas estavam usando sacolas de papel e muitas
árvores estavam sendo desmatadas no processo. Então ele criou uma sacola forte que era leve e duraria por anos. Para ele, isso significava que as pessoas usariam a sacola de novo e de novo, e menos árvores seriam desmatadas. "O
que estamos todos sendo encorajados a fazer hoje, que é levar nossa
própria sacola para o mercado, ele estava fazendo nos anos 70 e 80, mas
de forma natural. Por que não faríamos isso?", diz Raoul Thulin. Mas
as pessoas começaram a jogar fora até sacolas plásticas reutilizáveis
depois de usá-las uma vez, e agora o mundo tem que lidar com um gigante
problema de poluição de plástico.
Então, o que é melhor?
É simples. Se você tem que substituir sua sacola com mais frequência, ela vai ter um efeito ambiental maior. "Então
a chave para reduzir o impacto de todas as sacolas — não importa do que
forem feitas — é reusá-las quanto mais pudermos", diz Margaret Bates. Muitas
pessoas esquecem de levar suas sacolas plásticas reutilizáveis em seu
mercado semanal, e precisam comprar mais sacolas plásticas no caixa, ela
diz. Isso tem um impacto ambiental muito maior do que fazer uma escolha entre usar apenas sacolas de papel, plástico ou algodão. Fonte: BBC
Nova pesquisa revela 'localização exata' do aparecimento do homem moderno
Helen BriggsBBC News
29 outubro 2019
Direito de imagemGetty ImagesA paisagem da região é muito mais árida hoje
Cientistas
localizaram a "terra natal" do homem moderno em uma região ao sul do Rio
Zambeze, no norte da atual Botsuana, na África.
A área é atualmente tomada por salinas, mas já abrigou um enorme lago, que pode ter sido nosso lar ancestral há 200 mil anos. Nossos
ancestrais habitaram essa região por 70 mil anos, até que o clima local
mudou, sugere um estudo publicado na revista científica Nature. Eles começaram a se deslocar por meio de "corredores verdes" de
terras férteis, abrindo caminho para futuras migrações para fora da
África. "Está claro há algum tempo que os seres humanos
anatomicamente modernos apareceram na África há cerca de 200 mil anos",
afirmou a professora Vanessa Hayes, geneticista do Instituto Garvan de
Pesquisa Médica na Austrália. "O que se debate há muito tempo é a
localização exata desse surgimento e a subsequente dispersão de nossos
ancestrais mais antigos". As conclusões da professora Hayes despertaram ceticismo, no entanto, entre outros pesquisadores da área.
Região de lagos
A área em questão está localizada ao sul da bacia do Rio Zambeze, no norte de Botsuana. Os
pesquisadores acreditam que nossos ancestrais se estabeleceram perto de
um imenso sistema de lagos da África, conhecido como Lago Makgadikgadi,
que hoje é uma área de vastas salinas. "É uma área extremamente
grande, teria sido muito úmida e exuberante", disse Hayes. "E isso
realmente forneceria um habitat propício para os seres humanos modernos e
a vida selvagem viverem". Após viverem lá por 70 mil anos, eles
começaram a migrar. Uma mudança nos regimes de chuva na região levaram a
três ondas de migração há 130 mil e 110 mil anos, impulsionadas pelos
"corredores verdes" de terras férteis que foram se abrindo. Direito de imagemChris Bennett, Evolving Picture, Sydney, AustraliaHayes aprendendo a fazer fogo com os caçadores Jul'hoansi no Deserto de Kalahari, na Namíbia
Os primeiros migrantes se aventuraram rumo a
nordeste, seguidos por uma segunda onda de migração que se dirigiu para
sudoeste — uma terceira parte da população permanece em sua terra natal
até hoje. Esse cenário é baseado no rastreamento genético da
árvore genealógica humana, realizado por meio da análise de centenas de
amostras de DNA mitocondrial (o fragmento de DNA passado adiante pela
linhagem materna — de mãe para filho) de africanos vivos. Combinando
genética com geologia e simulações de modelos climáticos pelo
computador, os pesquisadores conseguiram criar uma imagem de como
poderia ser o continente africano há 200 mil anos.
Reconstruindo a história humana
O
estudo foi recebido, no entanto, com cautela por um especialista, que
afirma que não é possível reconstruir a história da origem humana apenas
com base no DNA mitocondrial. Outras análises geraram resultados diferentes — descobertas de fósseis sugerem que a origem remete à África Oriental. O professor Chris Stringer, do Museu de História Natural de Londres, que não participou do estudo, afirmou que a evolução do Homo sapiens foi um processo complexo. "Você
não pode usar distribuições mitocondriais modernas isoladamente para
reconstruir uma única localização para as origens humanas modernas",
disse ele à BBC News. "Acho que se está exigindo demais dos dados.
Como você está olhando apenas para uma pequena parte do genoma, não é
possível traçar a história completa das nossas origens". Neste contexto, poderia ter havido vários "berços da humanidade", em vez de apenas um, que ainda não foram localizados. Fonte: BBC
Sem apoio, pesquisa que pode resolver problema mundial das superbactérias trava no Brasil
Felipe Souza - @felipe_dessDa BBC News Brasil em São Paulo
27 outubro 2019
Direito de imagemMateus Cardoso/ CNPEMModelagem mostra nanopartículas carregadas com antibiótico grudadas na superfície de bactérias
A Organização das
Nações Unidas (ONU), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o
ex-presidente americano Barack Obama são algumas das figuras e entidades
mais conhecidas que fizeram alertas sobre o crescimento exponencial das
superbactérias e seu risco para a população.
Cientistas estimam
que, caso nenhuma solução seja encontrada a tempo, em poucos anos o
número de mortes causadas por bactérias ultra-resistentes ultrapasse o
do câncer. Na esteira dessa urgência global, cientistas de
diversos países travam uma corrida para frear essa ameaça quase
invisível. A boa notícia é que um cientista brasileiro do Centro
Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), localizado em
Campinas (SP), conseguiu desenvolver, a partir do uso da nanotecnologia,
um remédio "teleguiado" capaz de atacar e destruir superbactérias com
uma microdosagem de antibiótico. A má notícia é que essa pesquisa — que vem ganhando relevância e
já foi publicada em importantes revistas internacionais — ainda está
longe de sair do papel. Cientistas entrevistados pela BBC
News Brasil dizem que isso ocorre porque os centros de pesquisa não têm
os recursos e os conhecimentos técnicos da indústria para fazer os
testes em grande escala e registrá-los antes de serem usados pela
população. Eles explicam que no laboratório é possível desenvolver
apenas o protótipo do medicamento. Os
pesquisadores do CNPEM até conseguem provar que o remédio funciona,
fazem simulações em micro-órgãos artificiais, mas não têm estrutura para
testar como ele reage em organismos mais complexos, como animais e
humanos. Os pesquisadores também não têm conhecimento técnico para
cumprir todas as etapas e exigências para aprovação do medicamento na
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Os maiores
especialistas nessa área são as grandes indústrias, que têm dinheiro e
estrutura necessários para um estudo desse porte. Testes como esses
podem ultrapassar a cifra de R$ 4 bilhões. Sem algo que combata de
maneira eficaz as superbactérias, o que a indústria faz hoje, segundo
os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, é "enxugar gelo". Isso
ocorre porque, mesmo que as empresas invistam alto e passem anos
desenvolvendo um novo medicamento, seus efeitos duram pouco tempo, pois
as bactérias passam por mutação e criam resistência a ele.
Nanopartícula teleguiada
Uma
das explicações para o fortalecimento dessas bactérias é que, muitas
vezes, o paciente não as mata completamente. Por não seguir o tratamento
pelo tempo recomendado, as bactérias sobrevivem e ficam imunes aos
medicamentos que antes as combatiam, sofrem mutação e ficam ainda mais
fortes. Hoje, quando uma pessoa toma um antibiótico ou qualquer
outra droga, ela se distribui indiscriminadamente pelo corpo. Um
paciente com dor na garganta, por exemplo, toma um antibiótico para
curá-la, mas os pés, orelhas e mãos também serão afetados pelo
medicamento. O cientista Mateus Borba Cardoso, do CNPEM, explica
como funciona o seu estudo mais promissor: a nanopartícula teleguiada
com antibiótico. Ele diz que consegue usar uma quantidade até mil vezes
menor de antibiótico e direcioná-lo à bactéria para combatê-la
diretamente. Hoje, o antibiótico se espalha por todo o corpo, por isso é
necessária uma quantidade tão grande para tratar bactérias. Direito de imagemFelipe Souza/ BBC News Brasil
Cientista brasileiro é o responsável por uma das mais promissoras pesquisas sobre superbactérias do mundo
"A gente está desenvolvendo nanopartículas
direcionáveis. A partir do momento em que a gente administra o
medicamento no paciente, ele tem um tropismo pela região doente, como um
GPS. A grande vantagem é tomar uma quantidade mil vezes menor de
antibiótico ou antitumoral e ter um efeito igual ou ainda mais acentuado
que um remédio comum porque todo o fármaco vai para o lugar onde
desejamos. Hoje, não existe nenhum medicamento que faz isso no mundo",
afirmou o cientista. Mas para que o antibiótico não reaja com
outros organismos ao longo do caminho até a bactéria ou seja combatido
por anticorpos, ele desenvolveu um disfarce para que o medicamento não
seja identificado pelos mecanismos de defesa do corpo como uma ameaça. Ele
"colou" moléculas de água ao redor do remédio para que ele seja visto
como algo inofensivo. Assim, as nanopartículas podem fazer seu trajeto
"fantasiadas" e só liberam a carga de droga quando chegam ao destino. "O
mecanismo funciona, mas precisa ser testado em organismos vivos. A
pesquisa já está madura o bastante para isso, mas todos esses testes são
necessários para garantir que a droga fique estável e possa ser
comercializada em larga escala, mundialmente", afirmou Cardoso à BBC
News Brasil. Três papers publicados na Nature mostram que após a segunda injeção o sistema já estava reconhecendo essa fantasia.
Corrida mundial
Mateus
Cardoso conta que há outros quatro grupos científicos no mesmo caminho
para tentar solucionar o problema das superbactérias. Ele diz que
conhece a estratégia de cada um deles e afirmou que cada um tem uma
abordagem diferente para atacar as superbactérias. Um desses grupos é
americano, outro chinês e dois alemães. O projeto brasileiro, o
único que usa nanotecnologia teleguiada, ainda não recebeu nenhuma
proposta de financiamento para que possa avançar nas pesquisas. Sem
dinheiro, Cardoso contou que vai iniciar os testes numa escala limitada. "Nós
somos um dos poucos grupos do mundo que conseguem chegar de forma
seletiva em bactérias. Isso é muito difícil pois as bactérias têm poucas
possibilidade de ancoramento (ligação seletiva por meio de um sistema
chave-fechadura) , pois a superfície delas é 'consideravelmente
simples', quando comparadas a vírus e células", afirmou Cardoso. A
BBC News Brasil procurou as três indústrias farmacêuticas (EMS, Sanofi e
Hypera Pharma) que mais lucraram no último ano para saber se elas
conhecem o projeto, se costumam fazer parcerias com cientistas
brasileiros, se visitam os centros acadêmicos, quantas fórmulas produziu
nos últimos anos e quantas comprou do exterior. Nenhuma delas quis
comentar o assunto. O presidente-executivo do Sindicato da
Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), Nelson Mussolini, diz
que há diversas pesquisas em andamento no Brasil, feitas principalmente
a partir de parcerias entre indústrias e universidades. Direito de imagemFelipe Souza/ BBC News BrasilPresidente do sindicato que representa indústrias
farmacêuticas diz que outros países têm mais tradição em 'vender' seus
estudos em busca de financiamento
Ele diz que essas parcerias são confidenciais, mas
revela que uma delas, feita em parceria com a USP, já recebe o seu
segundo royalty (uma parte do lucro). Há ainda parcerias com Unicamp,
PUC Rio Grande do Sul e outros institutos de pesquisa. Ele cita diversos
fatores econômicos que dificultam o investimento em pesquisa no Brasil. "Na
melhor das hipóteses, uma pesquisa sobre medicamentos demora de 10 a 12
anos e tem um custo de até US$ 1 bilhão (R$ 4,15 bilhões) para
lançá-lo. As empresas brasileiras fazem pesquisas, mas escolhem os ramos
com retorno mais garantido. Em outros países, é mais fácil porque o
governo também faz parceria com os pesquisadores e ainda há empresas
como a Bayer, que tem um lucro que vale por toda a produção brasileira",
afirmou Mussolini. O presidente da Sindusfarma também disse que
no Brasil não há uma tradição dos centros de pesquisa e universidades
"venderem" seus estudos em busca de financiamento, e vice-versa. Na
visão dele, pesquisadores e indústrias precisam se comunicar mais, para
possibilitar mais parcerias. "Agora que estão passando por
dificuldades que os cientistas estão saindo da caixinha, buscando
financiamento privado. O pesquisador precisa sair de seu casulo e dizer
que está fazendo pesquisa e tem interesse em receber financiamento. Mas
isso é uma chave que não muda da noite para o dia", disse. "Por
outro lado, na Europa e nos Estados Unidos você tem profissionais que
ficam visitando universidades e centros de pesquisa atrás de novos
medicamentos. Aqui não tem", afirmou Mussolini. Para ele, a
pesquisa sobre superbactérias desenvolvida no CNPEM tem um grande
potencial para ser financiada por uma instituição privada. "O cara
desenvolveu um produto farmacêutico que combate de forma eficaz a
superbactéria. Não é que vai ter uma indústria querendo investir nele,
mas uma fila, nacional e internacional", afirmou o presidente do
sindicato que representa as indústrias farmacêuticas. Lucio
Freitas Junior, pesquisador do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da
USP, disse que há indústrias brasileiras capazes de financiar grandes
estudos, mas que historicamente não apostam em pesquisas. "Por
outro lado, o pesquisador também não está acostumado a cumprir metas e
apresentar propostas. Na academia, ele quer ter dinheiro, mas não quer
cobrança. Fui numa farmacêutica e propus uma tecnologia. Meus dois
pós-docs foram financiados pela indústria. Dinheiro não falta, mas a
cobrança, para muitos, é fatal", disse Junior.
Fuga de cérebros
Cientistas
dizem que essa falta de financiamento das indústrias aliada aos
recorrentes cortes de verbas de bolsas da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (Capes) e do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) causam uma fuga de
cérebros do Brasil. Neste ano, professores de universidades brasileiras
de prestígio já deixaram o país para trabalhar em grandes empresas,
principalmente na Europa. Os profissionais que permanecem no
Brasil entendem isso como um ataque à ciência. Para eles, a atual
política de cortes vai na contramão mundial, inclusive de países em
desenvolvimento, como China e Índia. Uma das poucas exceções,
disseram, é a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
(Fapesp), que ainda consegue financiar a parte laboratorial dos grandes
projetos, como o de Cardoso, que diz ter dinheiro de sobra para essa
etapa de sua pesquisa. Para alguns dos entrevistados pela BBC News
Brasil, a indústria brasileira de medicamentos não tem capacidade de se
integrar com a academia. Direito de imagemFelipe Souza/ BBC News BrasilFalta de financiamento das indústrias aliada aos
recorrentes cortes de verbas de bolsas causam uma fuga de cérebros do
Brasil, segundo cientistas
"Eles querem ter um retorno rápido, lucro imediato.
Mas também há um desconhecimento. Uma indústria da área de produtos para
higiene pessoal nos procurou para um projeto, mas os cientistas nem
sequer conseguiram entender o que eles queriam por causa do despreparo
dos profissionais", disse Mussolini. Os baixos salários pagos pela
indústria nacional, segundo esses profissionais, na comparação com o
pagamento oferecido por empresas de fora são outra razão para que
pesquisadores optem por deixar o país.
Um problema social
Hoje,
a produção de medicamentos não consegue acompanhar a velocidade de
evolução das bactérias. O uso indiscriminado de antibióticos é um dos
motivos, segundo especialistas. "Quando um paciente toma doses
pequenas por conta própria, ele não mata a bactéria. Essas que não
morrem são descartadas pelo corpo na urina e fezes. Isso causa um
problema social, pois essa água chega a um afluente e contamina a água e
peixes. Todos ficam com bactérias mais resistentes a antibióticos",
afirmou o cientista Mateus Cardoso. O problema apontado pelos
cientistas do CNPEM de os antibióticos vendidos atualmente atuarem no
corpo inteiro, e não apenas de forma localizada, poderia ser resolvido
por meio das nanopartículas direcionáveis. Além da vantagem de a dose
ser mil vezes menor e atacar apenas as superbactérias, evita que mais
antibiótico seja despejado no meio ambiente. Uma estudante também do CNPEM, em Campinas,
está usando esse mesmo sistema de "teleguiar" nanopartículas em sua
tese de doutorado. Ao invés de atacar inflamações, seu estudo é baseado
em destruir células com câncer.
Antibiótico personalizado
Uma
nanopartícula tem um tamanho mil vezes menor que o diâmetro de um fio
de cabelo. Além de carregar uma partícula tão pequena com antibiótico e
ainda "fantasiá-la" de água, os cientistas estão projetando um sistema
que funcione ainda melhor no futuro. A ideia dos cientistas é
criar um sistema de chave e fechadura personalizado para cada paciente.
Dessa forma, um exame identificaria qual bactéria afeta o órgão e
produziria um antibiótico para combatê-la da maneira mais efetiva
possível. "A intenção é que daqui a 50 anos um paciente
diagnosticado com câncer ou com alguma bactéria vá a um laboratório onde
seja feito um estudo para saber quais receptores há nela e quais
fármacos a combate. A partir disso, será possível produzir as partículas
com os fármacos e os co-receptores que vão se ligar a elas, de forma
seletiva, para combatê-las", afirmou. Esse pode ser o próximo passo para um tratamento personalizado no futuro. Direito de imagemFelipe Souza/ BBCEm sua tese de doutorado, uma estudante do CNPEM
está usando o mesmo sistema de 'teleguiar' nanopartículas para combater
células com câncer
Teoria da conspiração
O
vencedor do prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina em 1993, Richard J.
Roberts, é uma das referências entre os que defendem a corrente de que
as indústrias farmacêuticas não têm interesse em produzir remédios que
curam definitivamente, com a intenção de vender cada vez mais
medicamentos. "Essa é uma das teses que não têm cabimento. Se eu
tenho um produto para combater o mal de Alzheimer, por exemplo, você
acha que eu não vou querer vender esse produto? Você já imaginou quanto
valorizaria uma empresa na bolsa de Nova York que conseguir curar todos
os tipos de câncer líquidos?", afirma Nelson Mussolini, presidente da
Sindusfarma. "Se fosse assim, a penicilina não estaria no mercado.
Quantas milhares de vidas ela salvou? A indústria que fazia a
penicilina foi vendida por bilhões de dólares por ter uma história de
sucesso", disse. Para a indústria farmacêutica, defende o
presidente do sindicato do setor, "o ideal é que as pessoas não
morressem, porque quanto mais elas vivem, mais precisam de novos
produtos". "Essa é a teoria da conspiração de que o farmacêutico
quer matar a população. Nós queremos salvar vidas. As pessoas estão
vivendo mais e, por causa disso, há novas doenças e a indústria precisa
ganhar dinheiro para fazer novos medicamentos", afirmou. Direito de imagemFelipe Souza/ BBC News BrasilCNPEM é um dos principais centros de pesquisa do
país e conta com a única fonte de luz síncrotron (gerada a partir de um
acelerador de partículas) do Brasil
Procurado, o Ministério da Ciência, Saúde,
Tecnologia, Inovação e Comunicações disse que o governo federal investe
em diversas pesquisas, inclusive ensaios pré-clínicos — aqueles feitos
antes dos medicamentos serem testados em humanos. A pasta informou
que em 2018 lançou uma chamada pública para projetos de pesquisa de
novos medicamentos antibióticos no valor de R$ 1 milhão para o "Plano
Nacional de Enfrentamento à Resistência Antimicrobiana". O MCTIC
afirmou ainda que "financia instituições que atuam e promovem testes
pré-clínicos (de medicamentos), como no Centro de Inovação e Ensaios
Pré-Clínicos CIEnP, em Santa Catarina". O governo disse que o
Marco Legal aprovado em 2016 "favorece a colaboração entre centros de
pesquisa, empresas e governo para o desenvolvimento da ciência,
tecnologia e inovação" no Brasil. A pasta afirmou ainda que
"considera essencial a criação e manutenção de estruturas e ferramentas
que poderão proporcionar ao complexo industrial da saúde nacional a
capacidade de gerar novos negócios, expandir as exportações, integrar-se
à cadeia de valor e estimular novas demandas por produtos e processos
inovadores, levando em consideração as prioridades do Sistema Único de
Saúde". Fonte: BBC