sexta-feira, 28 de maio de 2021

MEC quer facilitar regulamentação de empresas de ensino superior

MEC quer facilitar regulamentação de empresas de ensino superior

Ribeiro disse que avaliação remota é o primeiro passo nessa direção 

Pedro Peduzzi - Repórter da Agência Brasil - Brasília
27/05/2021

© Catarina Chaves/MEC

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse hoje (27) a representantes de instituições privadas do ensino superior, que, entre as prioridades de sua pasta, está a de “simplificar” os trâmites burocráticos necessários para a regulamentação da iniciativa privada no ensino superior do país. Segundo o ministro, a avaliação remota feita nessas instituições pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) representa um passo dado pelo MEC nessa direção.

“O MEC foi, com o tempo, se transformando em um verdadeiro cartório, com instâncias e carimbos. Quero simplificar isso. Gostaria de ter no MEC uma secretaria de desregulamentação. No entanto, a lei impõe caminhos balizados por leis votadas e feitas no passado, mas que podem ser mudadas”, disse o ministro ao participar da abertura do 13º Congresso Brasileiro da Educação Superior Particular, promovido pelo Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular.

Ribeiro acrescentou que algumas propostas de mudanças vêm sendo estudadas pelo governo “para que a regulamentação se baseie em outro paradigma, de não acreditar que todos os empresários da educação estejam sempre prontos para burlar a lei”.

“Nossa legislação, no entanto, é feita dando a impressão de que todos são culpados. Queremos mudar a filosofia do MEC, e considerar todos inocentes até que se prove o contrário. Assim, quem eventualmente cometer deslizes ou agir de forma não ética, estes sofrerão maior dano, e não os que cumprem as tantas regras”, acrescentou ao dizer que tais medidas, a médio e longo prazo, “simplificarão a vida dos senhores nesse trabalho que é muito regulamentado”.

A proposta de avaliações remotas foi apresentada pelo Inep em abril. De acordo com a autarquia, a avaliação externa virtual in loco passará a ser feita integralmente online, com o objetivo de “melhorar o processo de avaliação do ensino superior brasileiro, especialmente diante do atual cenário causado pela pandemia da covid-19”.

As avaliações começaram a ser feitas em 26 de abril tendo como meta inspecionar remotamente a 11 instituições – número que a autarquia garante que incrementará gradualmente, mês a mês, até atingir a meta de 5 mil visitas no fim de outubro de 2021. Segundo Ribeiro, o objetivo é fazer cerca de 600 avaliações em junho; 700 em julho e 800 em agosto.

Nesse primeiro momento, a avaliação externa remota online não atenderá a todos os cursos. Medicina, odontologia, enfermagem e psicologia, por exemplo, continuarão sendo examinados presencialmente.
Aulas presenciais

O ministro disse aos representantes de instituições privadas de ensino superior que apoia “radicalmente o retorno [às aulas] com segurança”. “A aula presencial, para mim, é insubstituível. Todos equipamentos e ferramentas são úteis e necessários. A presença do professor e do aluno em sala de aula é algo que, para a construção do saber do aluno, é algo insubstituível”, defendeu Ribeiro.

O ministro acrescentou que o MEC tem estudado os riscos dessas aulas não presenciais. “O comprometimento na aprendizagem e potencial evasão escolar tem nos preocupado de maneira mais presente”, complementou.
Edição: Fernando Fraga

Fonte: EBC

Pesquisador da UFF está entre os mais influentes do Brasil em Ciência da Computação e Eletrônica

Pesquisador da UFF está entre os mais influentes do Brasil em Ciência da Computação e Eletrônica

SCS
27 MAI 2021

O docente do Instituto de Computação Celso da Cruz Carneiro Ribeiro integra o ranking dos pesquisadores mais influentes que atuam no país na área da Ciência da Computação e Eletrônica, de acordo com o Guide2Research (https://www.guide2research.com/). Ele aparece em 9ª posição na classificação que tem como base o índice H do Google Scholar, as citações e o número de documentos DBLP coletados até o dia 10 de maio de 2021.

Professor Celso Ribeiro é membro da Ordem Nacional do Mérito Científico e da Academia Brasileira de Ciências, além de Cientista do Nosso Estado da FAPERJ. “Minhas pesquisas são apoiadas pelo CNPq, como bolsista de produtividade em pesquisa 1-A e pelo Edital Universal. As publicações e resultados obtidos foram apoiados por programas e agências de financiamentos à pesquisa, pela cooperação internacional intensa e pela colaboração contínua com coautores e 32 doutorandos e 39 mestrandos que orientei. Apenas a manutenção dos programas e orçamentos das universidades e agências brasileiras de financiamento à C&T permitirá que nossos cientistas continuem se destacando internacionalmente, em vez de emigrar para instituições no Exterior com condições mais estáveis de financiamento", pondera o docente.

O Guide2Research é uma plataforma de pesquisas dedicada à Ciência da Computação, cujo objetivo é dar visibilidade aos estudos realizados pelos principais profissionais da área, contribuindo assim para o avanço científico em todo o mundo.

No portal é possível obter informações sobre os principais cientistas, as principais conferências e periódicos acadêmicos da área.

Fonte: UFF

Núcleo de Pesquisas da UFF atua no desenvolvimento sustentável de áreas de preservação ambiental no Estado do RJ

Núcleo de Pesquisas da UFF atua no desenvolvimento sustentável de áreas de preservação ambiental no Estado do RJ

Crédito da fotografia: 
Sávio Freire Bruno

Apesar de o formato do nosso planeta, que é esférico por natureza, nunca mudar, os modos de representação simbólica de sua estrutura podem ser alterados com o tempo, a exemplo dos mapas. A cada novo território identificado e descoberto, segue-se um ritual de catalogação e nomeação para que sua existência possa ser conhecida oficialmente por todos, não se limitando àquelas pessoas que têm um contato direto com o lugar.

Esse é o caso, por exemplo, da Praia Índia Potira e da Praia do Sal, que pertencem ao município de São Pedro da Aldeia, no estado do Rio de Janeiro. Elas foram cartografadas, recebendo uma denominação ainda provisória, através do trabalho de mapeamento desenvolvido pelo Núcleo Experimental de Iguaba Grande (NEIG), da Universidade Federal Fluminense (UFF). O estudo desenvolvido pela instituição foi responsável não somente por delimitar o espaço, mas definir essas novas praias, propondo inclusive sua nomenclatura. Os nomes sugeridos, no entanto, ainda não foram oficializados e a decisão ficará a cargo do Poder Executivo Municipal.

A ideia é desenvolver projetos que atendam às demandas da universidade e que, como resultado, tragam benefícios à sociedade, sempre com base nos princípios da preservação dos ativos ambientais, desenvolvimento sustentável e utilização racional dos recursos naturais”, Antonio Claudio Lucas da Nóbrega, reitor da UFF. 

O coordenador do NEIG e professor do Departamento de Patologia e Clínica Veterinária da Faculdade de Veterinária da UFF, Sávio Freire Bruno, explica que a Praia do Sal foi assim nomeada em função da proximidade em relação à antiga Estrada do Sal, utilizada para chegar até a antiga salina local, favorecendo o transporte desse produto, no passado. Nesse recorte geográfico, percebe-se uma enseada bem característica de praia, com suas singularidades próprias. Já com relação à outra região, o coordenador afirma que, considerando a história local, sugeriu-se batizá-la de Praia da Índia Potira, nome dado em alusão à nativa Tamoio, filha do chefe indígena Aimberê.

Localizado na divisa entre os municípios de Iguaba Grande e de São Pedro da Aldeia, o NEIG é um campus pertencente à Faculdade de Veterinária e ocupa uma área de 1.449. 047 metros quadrados. Sua aquisição ocorreu na década de 1960, através de uma doação do ex-presidente Juscelino Kubitschek, com a finalidade de se tornar uma granja-escola para aulas práticas de grandes animais. Nessa época, a área era conhecida como “Morro do Governo”. 


Por se tratar de uma região com alta salinidade, ventos fortes, vegetação de restinga e terreno levemente acidentado, com solo ácido e raso, o objetivo inicial de se tornar uma granja-escola, um local para práticas com animais domésticos de grande porte, como idealizado no passado, acabou não prosperando. O Núcleo, no entanto, reformulou sua proposta de atuação, passando a assumir um papel ativo na conservação e no ordenamento sustentável local, por meio da elaboração de plantas topográficas e mapas confeccionados, entre outras ferramentas úteis para esse fim. Além disso, ressaltou Sávio Bruno, “a vasta diversidade biológica, as peculiaridades geomorfológicas e os aspectos socioeconômicos e ambientais, entre outras características, reforçam a importância do Núcleo para a preservação e desenvolvimento da região em que está inserido”.

A adoção dessa nova estratégia por parte do NEIG não é casual: a área onde ele está localizado integra uma região de proteção ambiental, que está inserida na Área de Proteção Ambiental (APA) Estadual Serra de Sapiatiba, reconhecida como unidade de conservação de uso sustentável, e tendo como um dos parceiros oficiais o Instituto Estadual do Ambiente (INEA/RJ). Em conformidade com sua atual função dentro e fora da universidade, inclusive, o NEIG em breve passará a se chamar Reserva Ecológica Ponta da Farinha / Faculdade de Veterinária / UFF, ocasião que pretende marcar sua plena inserção em atividades inerentes às suas características socioambientais.

Atento ao potencial dessa área dedicada a projetos de preservação de espécies animais e da vegetação nativa, o reitor da UFF, Antonio Claudio Nóbrega, visitou recentemente o espaço a fim de verificar suas necessidades estruturais atuais, assim como elaborar um planejamento estratégico, com o propósito de assegurar ao Núcleo uma posição institucional avançada, referenciada e com segurança patrimonial. “A ideia é desenvolver projetos que atendam às demandas da universidade e que, como resultado, tragam benefícios à sociedade, sempre com base nos princípios da preservação dos ativos ambientais, desenvolvimento sustentável e utilização racional dos recursos naturais”, enfatiza.

É preciso favorecer o entendimento da importância socioambiental dessa área onde está localizado o NEIG, considerando seus aspectos ecológicos e econômicos, de maneira a preservá-la e dar-lhe subsídios para sua ordenação territorial”, Sávio Freire Bruno, coordenador do NEIG e professor da Faculdade de Veterinária da UFF.

Sávio Bruno destaca que a importância ecológica dessa região vai além da beleza de sua vegetação nativa. Mesmo possuindo uma extensão territorial reduzida, ela abriga muitas espécies ameaçadas de extinção, a exemplo das aves formigueiro-do-litoral (categoria ameaçada), o trinta-réis-real e a borboleta-da-praia (ambos na categoria vulnerável). Esse é um dos motivos pelos quais “é preciso favorecer o entendimento da importância socioambiental dessa área onde está localizado o NEIG, considerando seus aspectos ecológicos e econômicos, de maneira a preservá-la e dar-lhe subsídios para sua ordenação territorial”, sublinha.

Frente a isso, o coordenador acrescenta que foi firmada, recentemente, uma parceria com a Prefeitura Municipal de Iguaba Grande, por meio de convênio, buscando reforçar a inserção do campus regionalmente, assim como também no âmbito acadêmico. Outra ação prática proposta foi a criação de um laboratório/observatório de ornitologia (estudo de aves), com forte potencial de pesquisa e desenvolvimento socioeconômico regional, considerando a observação da espécie como atividade dentro de uma proposta de turismo sustentável.








Sávio Bruno explica que a observação de aves segue uma tendência global de atividades que visam à valorização da biodiversidade, e se alinham ao desenvolvimento econômico e social da região. Segundo o coordenador, uma das premissas dessa prática é a de manter o ambiente inteiramente preservado, pois as aves são elementos integrantes do ecossistema a que pertencem. “É um tipo de atividade que confronta a ideia utilitarista, mercantilista, produtivista da natureza, nos moldes de sua derrubada e destruição ‘em prol do progresso’, como historicamente tanto alardearam em nosso país”, enfatiza.

Para Sávio, a comunidade biótica e especialmente a fauna ornitológica tornam-se, nesse sentido, atrativos para o turismo sustentável. “Toda uma gama de serviços para este público tão importante, que exerce o que chamamos de cidadania participativa, servem de base para a conservação de espécies. A observação de aves tem sido, portanto, não só uma expressiva fonte de renda para os serviços prestados direta e indiretamente pelas comunidades onde determinada avifauna se mantém, mas também representa um grande exemplo de que manter os recursos naturais de uma localidade ou região não só garante a continuidade dos ‘serviços ambientais’ mas do equilíbrio ecossistêmico, da Saúde Única e por que não, da Saúde Planetária”, finaliza

 Fonte: UFF

quinta-feira, 27 de maio de 2021

Maria Goeppert Mayer, a Nobel de Física que explicou números mágicos trabalhando sem remuneração

Maria Goeppert Mayer, a Nobel de Física que explicou números mágicos trabalhando sem remuneração

Ana Pais - BBC News Mundo
2 maio 2021

CRÉDITO,GETTY IMAGES
Maria Goeppert Mayer só se tornou professora titular aos 54 anos

"Voluntária", "bolsista", "pesquisadora associada": estes foram alguns dos títulos que Maria Goeppert Mayer acumulou ao longo de 30 anos liderando pesquisas científicas que a levaram a ganhar o Prêmio Nobel de Física em 1963.

Em outras palavras, a física alemã trabalhou a maior parte de sua carreira em diferentes universidades americanas sem receber salário.

Ela pesquisava "apenas pelo prazer de fazer física", diz sua biografia publicada pelo Prêmio Nobel.

Embora houvesse regras antinepotismo nos Estados Unidos naquela época, a verdade é que "nenhuma universidade teria pensado em contratar a esposa de um professor", explica a academia sueca.

Era o marido dela, o químico americano Joseph Mayer, que conseguia os cargos de professor e pesquisador em tempo integral, enquanto ela recebia as sobras. Literalmente.

"Ela viu um escritório vazio e perguntou se poderia usá-lo; negaram e, em vez disso, deram a ela uma sala no sótão", diz a renomada Universidade Johns Hopkins, nos EUA, uma das instituições de ensino onde o casal trabalhou.

A história dela, contada no âmbito do projeto The Women of Hopkins, "é um exemplo de determinação perante os obstáculos", reconhece a universidade.

Quando Goeppert Mayer finalmente se tornou professora titular, ela estava com 54 anos.

Sétima geração
Goeppert Mayer nasceu em 28 de junho de 1906 em Katowice, cidade que fazia parte da Alemanha na época, mas hoje pertence à Polônia.

O pai dela era a sexta geração de uma família de acadêmicos, e sempre presumiu que a única filha iria para a faculdade e seguiria o legado familiar.

"Meu pai costumava me dizer: 'Quando você crescer, não se torne uma mulher', no sentido de uma dona de casa", disse Goeppert Mayer, citada pelo Nobel.

CRÉDITO,GETTY IMAGES
'É uma daquelas mulheres que lutaram por seus objetivos quando a sociedade exigia que ficassem em casa', diz a física Louise Giansante

Embora inicialmente sua intenção fosse se formar em matemática, ela decidiu estudar física após participar de um seminário de mecânica quântica ministrado por Max Born, um dos pais do então incipiente ramo da ciência.

Born acabaria se tornando o mentor de Goeppert Mayer ao longo de seus anos de estudo na Universidade de Göttingen, na Alemanha.

Mas depois de completar o doutorado, a jovem se casou e mudou para os Estados Unidos, em parte em busca de melhores oportunidades acadêmicas e também para ficar longe do movimento político que culminaria na ascensão de Adolf Hitler ao poder.

Na verdade, durante a Segunda Guerra Mundial, Goeppert Mayer trabalhou no Projeto Manhattan, o programa secreto do governo americano que desenvolveu a bomba atômica.

Projeto Manhattan
"A urgência da Segunda Guerra Mundial levou o governo dos Estados Unidos a tratar a capacidade de Goeppert Mayer com mais respeito do que o demonstrado por suas universidades mais importantes", afirma o Nobel.

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Em 6 e 9 de agosto de 1945, os Estados Unidos lançaram duas bombas atômicas sobre Hiroshima e Nagasaki, no Japão

Ela chegou inclusive a dizer que, graças ao Projeto Manhattan, ela conseguiu pela primeira vez na carreira "se firmar" por conta própria como cientista, sem "se sustentar" no marido.

Seus biógrafos concordam que, embora ela apreciasse o respeito que recebeu dos colegas e as responsabilidades adquiridas durante aqueles três anos de trabalho, ela tinha esperança de que o projeto fracassasse.

De acordo com o Nobel, Goeppert Mayer era "veementemente anti-Hitler, mas ciente de que a arma que estava ajudando a criar poderia ser usada contra amigos e familiares que viviam na Alemanha".

E embora a bomba tenha sido desenvolvida e usada nas cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, matando dezenas de milhares de pessoas, as pesquisas lideradas por ela não foram efetivamente bem-sucedidas.

"Não encontramos nada e tivemos sorte... escapamos da culpa pungente que os responsáveis ​​pela bomba sentem até hoje", admitiria mais tarde, segundo o Nobel.

Os 'números mágicos'
Foi depois da guerra que Goeppert Mayer começou a trabalhar com física nuclear, linha de pesquisa que a levaria a definir a estrutura do núcleo atômico e ganhar o Prêmio Nobel.

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Quando Goeppert Mayer ganhou o Nobel de Física em 1963, ela se tornou a segunda mulher na história a receber o prêmio

Sem entrar em muitos detalhes técnicos, o que a cientista conseguiu demonstrar repetidamente é que os núcleos mais estáveis ​​sempre tinham uma certa quantidade de nêutrons ou prótons. Os "números mágicos" eram 2, 8, 20, 28, 50, 82 e 126.

Mas ela não se deu por satisfeita: agora que sabia que eram números especiais, queria saber por quê.

Foi assim que ela começou a desenvolver o que é hoje o famoso modelo nuclear de camadas.

De acordo com um artigo de 2008 da American Physical Society (APS), "o fato de que os núcleos com um certo número de núcleons (nêutrons e prótons) eram especialmente estáveis ​​já havia sido notado antes, mas os físicos tinham certeza de que um modelo de camadas não poderia estar correto."

É que nessa época prevalecia outro modelo criado por ninguém menos que Niels Bohr, que havia ganhado o Prêmio Nobel por suas pesquisas sobre a estrutura dos átomos.

De acordo com a APS, Goeppert Mayer "tinha uma formação menos formal em física nuclear, (então) estava menos enviesada".

Seu colega e amigo Edward Teller resumiu de forma mais eloquente: "Ela teve a ideia absurda de se opor ao modelo de núcleo atômico de Bohr. Fui enfático em minhas críticas. Mas acabou que Maria estava certa e, merecidamente, recebeu o Prêmio Nobel."

Uma de quatro
Goeppert Mayer não era a única capaz de pensar de forma inovadora sobre a estrutura do núcleo atômico.

Quando estava prestes a enviar sua pesquisa para a Physical Review, soube que outra equipe liderada por Hans Jensen havia chegado à mesma conclusão na Alemanha.

"Ela pediu que adiassem seu artigo para ser publicado no mesmo número que o deles, mas o dela acabou sendo publicado em número depois do deles, em junho de 1949", diz o artigo da APS.

Mais tarde, Goeppert Mayer e Jensen se conheceram, se tornaram amigos e colaboradores. Juntos, publicaram um livro sobre o modelo nuclear de camadas e, em 1963, compartilharam o Prêmio Nobel.

Naquela época, apenas uma mulher na história havia recebido o Nobel de Física: Marie Curie, 60 anos antes.

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Marie Curie foi a primeira pessoa a receber dois prêmios Nobel em áreas distintas, física e química, em 1903 e 1911, respectivamente

Levaria mais 55 anos para outra mulher, Donna Strickland, ganhar o prêmio novamente em 2018. A quarta e última física a conquistá-lo foi Andrea Ghez no ano passado.

O legado
Em 1960, pouco depois de chegar a San Diego para começar seu primeiro trabalho como professora titular na Universidade da Califórnia, Goeppert Mayer sofreu um ataque cardíaco.

Daí em diante, teria uma saúde frágil até sua morte em 1972, mas ainda assim não parou de pesquisar e dar aulas.

"É uma daquelas mulheres que lutaram por seus objetivos quando a sociedade exigia que ficassem em casa", diz à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, a física Louise Giansante, autora principal do artigo "Mulheres na física: pioneiras que nos inspiram", publicado em 2018 na revista da Organização Internacional de Física Médica.

"Ela enfrentou uma série de desafios em sua vida profissional e pessoal", acrescenta, "o que incluiu guerras e mortes, mas também simplesmente criar seus filhos e ser esposa enquanto tentava continuar sua pesquisa".

"Suas descobertas e contribuições marcantes são amplamente utilizadas até hoje. Acho que sua história precisa ser contada e pode servir de inspiração sobretudo para mulheres jovens, que ainda têm que enfrentar muitos desafios", conclui Giansante sobre o legado da física alemã.

Fonte: BBC

Primeiros testes com bomba atômica nos Estados Unidos criaram um novo material

Primeiros testes com bomba atômica nos Estados Unidos criaram um novo material

Kaique Lima
21/05/2021 

Os primeiros testes de uma bomba atômica, realizados em 1945 no estado americano do Novo México, formaram um novo material. Esse composto é uma substância vítrea, que foi batizada de trinitito vermelho. Forjado em altas temperaturas dentro de um pedaço de trinitita, ele é um grão de material com apenas 10 micrômetros de diâmetro, um pouco maior que um glóbulo vermelho.

Esse grão contém uma forma rara da matéria que é chamada de quasicristal, que nasceu junto com a era nuclear da humanidade. O novo experimento foi relatado em um estudo publicado no último dia 17 de maio na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS).

Os cristais normais são compostos por átomos presos em uma rede que se repete em um padrão regular. Já a estrutura dos quasicristais, apesar de ser ordenada, não se repete, ou seja, eles podem ter propriedades que são “proibidas” nos cristais. Sua descoberta foi feita no início dos anos 1980 e eles também aparecem na natureza em meteoritos.

Os quasicristais descobertos no Novo México são os mais antigos feitos por humanos. Seu nome, trinitita, é uma referência ao nome do teste nuclear no qual eles foram criados, a Experiência Trinity, realizada em 1945 no chamado Site Y, que foi o primeiro teste nuclear da história.

Contudo, o trinitito estudado pela equipe do geofísico Terry Wallace, diretor emérito do Laboratório Nacional de Los Alamos, que é o nome atual do Site Y, é de uma variedade mais rara, chamada de trinitito vermelho. Em geral, este quasicristal tem uma coloração mais esverdeada, porém, o trinitito vermelho contém cobre, que vem dos restos dos fios que se estendiam do solo até a bomba.

Formação dos quasicristais
Os quasicristais se formam em materiais que sofreram um impacto violento e, em geral, envolvem metais. O trinitito vermelho, na teoria, se encaixa nesses dois critérios. Porém, os pesquisadores precisavam encontrar algumas amostras dele antes para poderem estudá-lo.

“Passei meses procurando por trinitito vermelho por aí”, disse o físico teórico Paul Steinhardt, da Universidade de Princeton, nos EUA. Porém, ele só foi receber amostras quando Luca Bindini, mineralogista da Universidade de Florença, na Itália, passou a colaborar com a equipe. Ele havia conseguido uma amostra do material com outro especialista.

Normalmente, a trinitita apresenta uma coloração esverdeada. Crédito: Wikimedia Commons

Em seguida, o trabalho começou a ser feito, com Bindi examinando cada partícula do grão microscópico. Logo depois, o grão foi extraído da trinitita e irradiado com raios X, com os pesquisadores revelando, finalmente, que o material tinha um tipo de simetria encontrado somente em quasicristais.

O trinitito vermelho é formado de silício, cobre, cálcio e ferro. Em entrevista para o Science News, o mineralogista do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), Chi Ma, que não participou do estudo, declarou que o material é “totalmente novo para a ciência”. “É uma descoberta muito legal e emocionante”, disse ele.

Para o futuro, cientistas pretendem examinar outros locais que sofreram golpes violentos, como crateras de impacto e outros locais de testes nucleares. O objetivo é encontrar estruturas que são formadas por um forte impacto no solo.

quarta-feira, 26 de maio de 2021

Vacinas contra covid-19 só chegarão para todo mundo no fim de 2023 no ritmo atual, calcula editor-chefe da Lancet

Vacinas contra covid-19 só chegarão para todo mundo no fim de 2023 no ritmo atual, calcula editor-chefe da Lancet

André Biernath - BBC News Brasil em São Paulo
19 maio 2021

CRÉDITO,GETTY IMAGES
Especialista acredita que países mais ricos devem pensar em doar doses excedentes de vacinas contra a covid-19 para os locais que não têm condições de comprar vacinas por conta própria

O microbiologista John McConnell tem um privilégio único: ler em primeiríssima mão os estudos que avaliam a segurança e a eficácia das vacinas contra a covid-19.

O cientista é editor-chefe da The Lancet Infectious Diseases, revista científica que publicou as mais importantes pesquisas sobre a pandemia e os imunizantes nos últimos meses.

Ele é responsável por receber os manuscritos originais, enviados por laboratórios e especialistas de várias partes do mundo, e encaminhá-los para o time de editores independentes, que faz a revisão e a análise do conteúdo antes da divulgação.

Formado em microbiologia clínica e parasitologia pela Universidade East London, na Inglaterra, McConnell atua na The Lancet desde 1990.

Em 2001, ele foi um dos fundadores e logo tornou-se editor-chefe da The Lancet Infectious Diseases, uma revista voltada 100% para as doenças infecciosas.


No final de abril e no começo de maio, o cientista foi convidado para uma série de webinários no Brasil promovidos pela Elsevier, empresa de informação analítica responsável por diversas publicações científicas, incluindo a própria The Lancet.

Numa entrevista à BBC News Brasil feita por e-mail, McConnell avaliou o atual ritmo de vacinação no mundo e destacou que o fim da pandemia está necessariamente vinculado às ações globais.

"Acredito que nós conseguiremos sair juntos dessa pandemia, desde que não percamos o foco. Só assim faremos que a luz no fim do túnel não seja destinada apenas para ricos e afortunados, mas para todos", disse.

Sobre a situação particular do Brasil, o microbiologista entende que nosso país precisa aliar duas estratégias: acelerar a imunização e promover as medidas preventivas.

"As duas ações precisam andar de mãos dadas. Depender inteiramente da vacina significa que o progresso será lento. Precisamos proteger as pessoas por meio de intervenções não farmacológicas, dando-as a oportunidade de serem vacinadas no futuro", analisou.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

BBC News Brasil - Num feito inédito, a humanidade conseguiu desenvolver, testar e aprovar várias vacinas contra uma mesma doença em pouco menos de um ano. Como o senhor avalia esse progresso?
John McConnell - Acho que é o culminar de muitos anos de trabalho no desenvolvimento das tecnologias, o que nos permitiu gerar vários tipos diferentes de vacinas, que agora estão sendo aplicadas em bilhões de pessoas.

Uma dessas tecnologias, que usa vírus inativados, já existe há um século ou mais. A tecnologia que utiliza as chamadas subunidades proteicas é aplicada às vacinas contra a hepatite B, por exemplo, há muitos anos.

E mesmo as vacinas de vetores virais, como as de Johnson & Johnson e AstraZeneca/Oxford, se valem de uma tecnologia que vem sendo usada em ensaios clínicos há cerca de 20 anos, principalmente em três imunizantes licenciados contra o ebola.

E, embora se acredite amplamente que as vacinas de mRNA, como as de Pfizer/BioNTech e Moderna, são novas e essa é a primeira vez em que se utiliza tal tecnologia, a verdade é que o trabalho de desenvolvimento de produtos semelhantes está em andamento por quase 30 anos.

Antes da covid-19, havia vacinas em testes clínicos usando a tecnologia de mRNA contra doenças como aids, zika e raiva, por exemplo.

Portanto, embora as vacinas de Pfizer/BioNTech e Moderna sejam as primeiras a usar essa tecnologia em uma escala muito grande em seres humanos, elas se baseiam em um conhecimento existente e bem testado.

Então, de certa forma, tivemos sorte que a pandemia surgiu em um momento em que temos algumas formas muito bem estabelecidas de produzir vacinas, bem como um conjunto de novas tecnologias, para as quais havia um pouco de experiência clínica.

CRÉDITO,DIVULGAÇÃO/THE LANCET
O microbiologista John McConnell recebe, em primeira mão, os artigos científicos mais importantes sobre a covid-19 e as vacinas

BBC News Brasil - Como o senhor mesmo mencionou, temos diversas plataformas tecnológicas bem-sucedidas neste momento. Qual a importância dessa variedade nos tipos de imunizantes?
McConnell - Nunca foi garantido que uma determinada tecnologia funcionaria, então acho que era muito importante ter uma gama de tentativas diferentes, mesmo que, quando aplicadas na vida real, elas sejam comparáveis ​​em relação à eficácia.

É importante ter vacinas que possam ser distribuídas de diferentes maneiras. Por exemplo, as vacinas de Pfizer/BioNtech e Moderna precisam de uma cadeia de frio para distribuição que requer congelamento, enquanto as vacinas de AstraZeneca/Oxford e Johnson & Johnson requerem apenas geladeiras regulares. Já a vacina da Bharat Biotech pode ser mantida em temperatura ambiente.

Precisamos de uma gama de tecnologias que podem ser levadas para diferentes contextos ao redor do mundo.

Também é importante ter vacinas que possam ser modificadas conforme surgem novas variantes do coronavírus. Algumas das tecnologias são mais facilmente adaptáveis do que as outras.

Devo acrescentar também que, ao usar diferentes formas de produção de vacinas, estamos aproveitando ao máximo as instalações de fabricação disponíveis em todo o mundo. Se dependêssemos apenas da tecnologia de mRNA, não haveria nenhuma maneira de produzir doses suficientes para 2022 ou 2023, mesmo nos países de alta renda.

Se você espalhar as vacinas por diferentes tecnologias, poderá usar a gama de instalações disponíveis em todo o mundo.

BBC News Brasil - E como foi acompanhar tantas novidades e saber, em primeira mão, os resultados de segurança e eficácia das vacinas, que o mundo inteiro aguardava com tanto interesse?
McConnell - É uma grande honra ser o canal através do qual flui essas pesquisas incrivelmente importantes durante a maior emergência de saúde pública do mundo nos últimos 100 anos.

É um verdadeiro privilégio ver esse material e organizar sua revisão antes da publicação. Sinto-me realmente em uma posição honrada e espero que o que estamos fazendo enquanto editores tenha algum impacto em controlar a pandemia o mais rápido possível.

BBC News Brasil - Em alguns países, como Israel, Emirados Árabes Unidos e Reino Unido, a campanha de imunização contra a covid-19 está bem adiantada. O que essa experiência de vida real nos revela sobre a efetividade das vacinas disponíveis?
McConnell - As vacinas parecem ser ainda mais efetivas quando aplicadas a grandes populações do que nos ensaios clínicos. Os dados provenientes de Israel e do Reino Unido mostram cerca de 90% de eficácia na prevenção de todas as formas de covid-19 para a vacina de Pfizer/BioNTech e algo em torno de 88% para a vacina de AstraZeneca/Oxford.

É bastante encorajador que as vacinas que estão sendo usadas em todo o mundo pareçam ser amplamente eficazes contra as variantes do vírus, particularmente em termos de prevenção de doenças graves e morte, embora não necessariamente previnam a infecção em si.

Se você olhar os gráficos, pode ver o quanto a taxa de novas infecções diminui nas populações que foram vacinadas, em comparação com aquelas que não receberam as doses ainda.

O Chile é um bom exemplo de como as vacinas estão realmente funcionando. Lá está claro que os casos se estabilizaram ou estão diminuindo nos indivíduos que foram vacinados, enquanto continuam a aumentar naqueles que não foram imunizados.

O motivo do aumento de casos, portanto, não é o fato de a vacina eventualmente não estar funcionando, mas porque ela ainda não foi administrada em um número suficiente de pessoas.

BBC News Brasil - Se, por um lado, a campanha deslancha em alguns lugares, outros países estão lidando com a escassez ou a falta absoluta de vacinas. Como o senhor avalia essa desigualdade global?
McConnell - Existe um mecanismo global chamado Covax, que foi projetado para comprar vacinas e distribuí-las a países que não têm condições de financiar seus próprios programas de vacinação.

No atual momento, esse programa foi elaborado para ajudar a vacinar apenas 20% das pessoas nessas nações de baixa e média renda.

Na atual progressão, levará até o final de 2023 para que as vacinas estejam disponíveis para todas as pessoas do mundo.

É imperativo que outros países, quando tiverem vacinado totalmente as suas populações, disponibilizem as doses restantes aos governos que não têm condições de pagá-las.

Alguns desses países mais ricos chegaram a contratar uma quantidade de vacinas suficientes para cobrir três ou quatro vezes a sua população total.

CRÉDITO,GETTY IMAGES
Por ora, apenas 2% da população do continente africano recebeu a vacina contra a covid-19, calcula McConnell

BBC News Brasil - O senhor acredita que é possível resolver esse problema da desigualdade global?
McConnell - É muito importante que os governos levem em consideração o interesse global para minimizar a quantidade de vírus em circulação em todo o mundo.

Quando os programas de vacinação nesses locais estiverem concluídos, e com o planejamento para os reforços necessários num futuro próximo, os países com estoques remanescentes precisarão considerar seriamente a doação de doses excedentes.

Enquanto o vírus permanecer em circulação, sempre existe a chance de ocorrer uma mutação para a qual alguns imunizantes atuais podem não ser eficazes.

Deixo aqui uma sugestão, sobre a qual não tenho opinião formada ou dados suficientes. Mas será que deveríamos priorizar a vacinação de crianças, que não são particularmente suscetíveis a essa doença e é extremamente improvável que tenham sintomas graves ou morram? Ou deveríamos priorizar os idosos e pessoas vulneráveis ​​dos países de baixa e média renda?

Para encurtar esse prazo de 2023, quando o mundo inteiro estará vacinado segundo as projeções atuais, precisamos nos fazer perguntas sobre nossas prioridades, e não apenas olhar para a realidade interna de nossos próprios países.

BBC News Brasil - Como o senhor vê a situação do Brasil? Nós temos um Programa Nacional de Imunizações reconhecido internacionalmente, mas a campanha contra a covid-19 avança lentamente…
McConnell - As vacinas parecem ser eficazes contra a variante P.1 e proteger até mesmo contra as formas mais graves da doença. Parece que o número de casos está começando a diminuir no Brasil.

Agora, o único caminho a seguir no Brasil é combinar uma distribuição ampla e rápida da vacina com a continuação das medidas de distanciamento físico. Isso tem se mostrado eficaz tanto em Israel quanto no Reino Unido.

As duas ações precisam andar de mãos dadas. Depender inteiramente da vacina significa que o progresso será lento. Precisamos proteger as pessoas por meio de intervenções não farmacológicas, dando-as a oportunidade de serem vacinadas no futuro.

BBC News Brasil - Mesmo com as primeiras vacinas contra a covid-19 aprovadas, nós temos uma série de outras candidatas que continuam em estudo. Por que é importante ter mais opções de imunizantes contra a covid-19?
McConnell - Pois bem, as vacinas que ainda estão em desenvolvimento terão a oportunidade de modificar suas formulações, para que sejam direcionadas contra as novas variedades do coronavírus.

O maior problema é que simplesmente não há vacina suficiente para todos. Atualmente, existem muitas fábricas no mundo que produzem os imunizantes. Se os diferentes países possuem suas próprias instalações de produção de vacinas e podem atender às suas demandas, isso é extremamente importante para controlar a pandemia o mais rápido possível.

Além disso, há também uma questão de preço. Alguns fabricantes, devido ao tipo de tecnologia que estão usando, produziram vacinas muito mais baratas e de distribuição muito mais fácil do que aquelas que foram desenvolvidas pela Pfizer/BioNTech, por exemplo.

Não consigo imaginar como todas as pessoas no mundo serão vacinadas se contarmos apenas com a vacina da Pfizer/BioNTech.

Assim como temos um arsenal muito amplo de antibióticos, por exemplo, acredito que precisamos de um arsenal variado de vacinas.

CRÉDITO,GETTY IMAGES
Para sair da pandemia, Brasil precisa acelerar vacinação e reforçar medidas não-farmacológicas, indica McConnell

BBC News Brasil - Como a vacinação ajudará a tirar o mundo desta pandemia? O senhor já vê alguma luz no fim do túnel?
McConnell - Sim, certamente há uma luz no fim do túnel. Para os países que implementaram seu programa de vacinação rapidamente, essa luz está muito forte.

Israel já reabriu completamente e o Reino Unido está a caminho disso. A França teve que introduzir um novo bloqueio, mas a combinação da vacinação com as medidas de restrição está levando esse país a uma posição em que poderá começar a aliviar as políticas em breve.

Até mesmo os Estados Unidos estão virando esse jogo, embora não seja a mesma realidade para todos os Estados. No entanto, os locais onde há uma ampla aceitação da vacina e onde as medidas de distanciamento físico têm sido mais rigorosas estão definitivamente evoluindo bem.

Alguns dados publicados pela autoridade de saúde pública na Inglaterra (Public Health England), indicam que quase 70% de todos os doadores de sangue têm anticorpos contra o coronavírus.

Esses 70% são o número estabelecido como a soroprevalência necessária para que exista uma imunidade coletiva. Ainda não podemos traçar uma linha rígida sobre isso, mas acredita-se que essa seja uma taxa importante.

Também sabemos que menos de 20% dessa soroprevalência é causada pela infecção natural. Então, a maior parte disso veio da vacinação.

Ainda precisamos de organização e disponibilidade de uma variedade de vacinas, mas há uma esperança real.

Essa luz ainda está escura para países do Sul da Ásia, como Paquistão, Bangladesh e Nepal, que não têm condições de pagar pelas vacinas. Nessa mesma linha, menos de 2% de toda a população do continente africano já recebeu suas doses. Portanto, algumas partes do mundo estão muito atrasadas.

Acredito que nós conseguiremos sair juntos dessa pandemia, desde que não percamos o foco. Só assim faremos que a luz no fim do túnel não seja destinada apenas para ricos e afortunados, mas para todos.

Fonte: BBC

Os 6 tipos de mensagens enganosas mais comuns contra as vacinas de covid-19 nas redes sociais e o que diz a ciência sobre elas

Os 6 tipos de mensagens enganosas mais comuns contra as vacinas de covid-19 nas redes sociais e o que diz a ciência sobre elas

Equipe de Jornalismo Visual da BBC News Brasil
17 de maio de 2021



Todas argumentam contra receber alguma vacina de covid-19, sem evidências concretas, usando informações falsas ou retiradas do contexto.

Às vezes a mensagem é direta: "Não tomo essa vacina porque vem da China. Quem me garante que foi bem feita?". Outras vezes, ela aparece como questionamento ético ("Os idosos não estão sendo cobaias dessa vacina?"), pregação religiosa ("Deus é a única proteção contra o vírus!"), meme, ou até piada.

Essas mensagens podem chegar pelo Facebook, Twitter, WhatsApp, Telegram, Instagram, YouTube — inclusive, repetidas, por vários desses canais ao mesmo tempo.

Apesar de falarem das vacinas, estes posts estavam inseridos em conversas sobre temas tão diversos como política, ciência, economia e até religião.

Elas podem até variar muito na forma, mas pouco no conteúdo: em geral, estão dentro de seis temas principais.

Essa é uma das conclusões à qual chegou um estudo da ONG First Draft, especializada no combate à desinformação, no qual a BBC News Brasil se baseou para analisar os posts com mais interações publicados no Facebook em português entre 1º de dezembro de 2020 e 31 de janeiro de 2021.

"Debater se as vacinas funcionam, se foram bem feitas, se alguém está lucrando com elas ou se há interesses políticos é completamente legítimo e normal num momento como esses", disse à BBC News Brasil Rory Smith, um dos autores do estudo da First Draft.

"Mas, uma vez que as vacinas são politizadas em um país, começamos a ver posts falando que vacina pode não ser boa porque tal político — de quem a pessoa não gosta — teria se beneficiado de algum acordo para distribui-la. E se não há provas disso ou as informações ali são falsas, o post está enganando as pessoas."

A análise da BBC News Brasil no Facebook, feita com palavras-chave relacionadas a vacinas de covid-19, mostrou que cerca de 22% de todas as interações (curtidas, comentários, reações e compartilhamentos) na rede social sobre o tema ocorreram em posts antivacina e desinformativos. 

Quando se fala em desinformação sobre vacinas, o que vem à mente são as teorias da conspiração e mitos de que os imunizantes poderiam interferir com o DNA humano ou fariam parte de um plano para controlar a população mundial.

Mas, na análise feita pela BBC News Brasil, as teorias conspiratórias não apareceram como o tema mais importante.

No Brasil, a desinformação esteve muito mais ligada ao debate político — até mesmo posts sobre a segurança das vacinas foram marcados pelo discurso partidário ou ideológico.

De acordo com o pesquisador Pablo Ortellado, coordenador do Monitor do Debate Político no Meio Digital da Universidade de São Paulo (USP), esse é um detalhe revelador do momento atual do país.

"Essas campanhas são construídas ao redor das dúvidas e hesitações naturais das pessoas sobre a vacinação. Elas dão elementos que fortalecem essas tendências com propósitos políticos. Pelo que observamos, isso não está ocorrendo dessa forma em nenhum dos outros países da América Latina, com grupos políticos tão organizados atuando", afirma.

A análise feita pela BBC News Brasil — usando a ferramenta Crowdtangle e com a colaboração do Monitor do Debate Político no Meio Digital — não fez nenhum tipo de filtragem por preferência política.

No entanto, 66% das interações em posts com informações falsas e antivacina aconteceram em páginas ou grupos que se declaram de direita, conservadores ou apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Em 34% dos casos não foi possível estabelecer preferências políticas específicas.

Declarações do presidente repercutiram nas redes e, em alguns casos, se tornaram hashtags ou palavras de ordem. "Ninguém pode me obrigar a tomar a vacina", ele afirmou em setembro de 2020. No mês seguinte, disse que "o povo brasileiro não será cobaia de ninguém". Depois, que não tomaria a vacina "e ponto final".

No último mês de abril, Bolsonaro disse que pretende se vacinar, mas que vai tomar "por último".

Em alguns casos, as táticas usadas para espalhar informações e notícias falsas não são novidade — elas foram usadas antes, para falar de outras vacinas, remédios ou tecnologias surgidas nas últimas décadas.

Entender o contexto desses discursos antivacina e estas estratégias de desinformação pode evitar que sejamos enganados e manipulados, afirma Rory Smith.

"Quando entendemos que cada meme, imagem, hashtag ou frase faz parte de uma narrativa, podemos combater as notícias falsas com informação de qualidade."

Sobre poder e dinheiro
Era esperado que, no momento em que se discutia a estratégia de vacinação do Brasil contra a pandemia, as redes sociais estivessem cheias de elogios ou críticas a governos pela compra de vacinas, a políticos, a empresas farmacêuticas e aos países onde os imunizantes são fabricados.

No entanto, o ambiente de forte tensão política em relação ao assunto criou um terreno fértil para as campanhas que usam a desinformação, segundo o pesquisador Pablo Ortellado.

É também o que mostra a análise da BBC News Brasil. Esse foi o tema com mais interações entre dezembro e janeiro — 36%.

Quase todos os posts estavam em páginas ou grupos de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro e atacavam o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). Algumas das publicações foram feitas por deputados de partidos da base do governo, como o exemplo abaixo.

Doria e Bolsonaro são possíveis rivais nas eleições presidenciais de 2022.

Os posts criticavam seu apoio à vacina CoronaVac, produzida por meio do laboratório chinês Sinovac e do Instituto Butantan, sugerindo que as pessoas não deveriam tomá-la porque ela seria pouco confiável, nem a própria China a estaria usando ou Doria estaria obtendo ganhos financeiros com a sua administração.

A vacina, chamada pejorativamente de "vachina", foi alvo de intensa disputa com o governo federal.

O termo pejorativo é muito usado nos posts que levantam suspeitas sobre a Coronavac por ser de origem chinesa. Segundo Ortellado, da USP, a expressão também aparece ligada à ideia de que a Organização Mundial da Saúde (OMS) teria sido "comprada" pela China, em teorias conspiratórias.

O que dizem os fatos?
O post usa a manchete do jornal O Globo que se refere a uma reportagem verdadeira do jornal americano The Washington Post. No entanto, o faz de maneira enganosa. No texto, publicado em 4 de dezembro de 2020, o jornal americano diz que, entre 2002 e 2011, o presidente da Sinovac, Yin Weidong, pagou propinas para um funcionário público que revisava e aprovava as vacinas feitas pela empresa na China.

Em 2016, o funcionário admitiu o crime e foi preso, mas o presidente foi inocentado e continua no comando da empresa. A reportagem não fala em pagamento a autoridades estrangeiras, e, até o momento, não há indícios de que isso tenha ocorrido no Brasil.

O jornal também afirma que o laboratório Sinovac nunca foi alvo de escândalos relacionados à segurança de suas vacinas. Além disso, não há nenhuma evidência de que as vacinas aprovadas no país, mesmo durante o esquema das propinas, apresentassem falhas.

Também não é verdade que a CoronaVac "não é confiável nem na China". Segundo o site Our World in Data, projeto da Universidade de Oxford, no Reino Unido, a vacina continua a ser aplicada na população chinesa, juntamente com a da empresa Sinopharm, depois de ter sido aprovada para uso emergencial em julho.

No Brasil, a vacina foi desenvolvida com recursos da Sinovac e do Butantan — cujo orçamento está, de fato, ligado à Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. Mas as doses produzidas pelo Butantan foram incorporadas ao Programa Nacional de Imunização (PNI), e o instituto também receberá dinheiro do governo federal para manter a produção.

Sobre reações e necessidade
Cerca de 25% das interações em português aconteceram em posts que colocavam em dúvida a segurança das vacinas, afirmando, sem provas ou com informações distorcidas, que elas podem causar efeitos colaterais sérios ou até a morte.

"É interessante observar como uma parte desse conteúdo é ‘zumbi', ou seja, coisas que já eram ditas sobre vacinas antes e foram adaptadas para esse novo contexto da covid-19", diz Rory Smith, da First Draft.

Isso é algo que já sabíamos que poderia acontecer. Mas, nesse caso, esse conteúdo tem mais sucesso, porque estamos falando de um vírus novo e de tecnologias novas para criar vacinas. Então, ainda não há tanta informação confiável disponível para as pessoas.Rory Smith, First Draft.

Por esse mesmo motivo, nessa discussão também aparecem posts afirmando que as vacinas não seriam necessárias contra a covid-19, já que cultivar um sistema imunológico naturalmente forte seria suficiente — algo que também não é correto.

Os posts em português traziam principalmente notícias falsas ou inconclusivas sobre supostas reações, efeitos colaterais graves ou mortes relacionadas a vacinas. É o caso do exemplo abaixo.

O Facebook classificou o vídeo que está na publicação como informação falsa, depois que ele foi conferido por agências de checagem parceiras da plataforma.

Estudos continuam sendo feitos para tentar mapear possíveis efeitos colaterais ou reações às vacinas. Mas, até agora, tudo indica que os benefícios superam os riscos.

O que diz a ciência?
Ao ser injetado no corpo, o RNA mensageiro de vacinas como a da Pfizer/BioNTech e a da Moderna, ensina as células do organismo a produzirem um pequeno (e inofensivo) fragmento da proteína spike do coronavírus.

A todo momento, dentro das células humanas, moléculas de RNA se formam para levar instruções presentes no nosso DNA até estruturas onde serão criadas as proteínas necessárias ao metabolismo. A vacina faz um papel semelhante.

Mas, nesse caso, o RNA presente na vacina já vem com instruções específicas de uma proteína do Sars-Cov-2. Ele não entra em contato com o DNA humano, nem pode alterá-lo. As partículas de RNA mensageiro levadas pela vacina também têm vida muito curta: entregam a "mensagem" e são destruídas.

O documento da Pfizer cujo link está na publicação é o protocolo de estudos clínicos da empresa, que deixa claro que mulheres grávidas não fazem parte dos testes, algo que é padrão em ensaios clínicos. Também afirma que participantes do sexo masculino devem manter abstinência sexual ou usar contraceptivos, para evitar a gestação.

A OMS já publicou recomendações sobre as vacinas oferecidas pela Pfizer/BioNTech e Moderna, e não aconselha que grávidas sejam vacinadas. Mas o alerta se baseia exclusivamente na falta de dados, e não em evidências de que tomar a injeção possa causar prejuízos à saúde da mãe e do bebê.

Além disso, não há nenhum "mecanismo biológico plausível" pelo qual uma vacina poderia afetar a fertilidade, explica Lucy Chappell, professora de Obstetrícia da Universidade King's College, no Reino Unido, e porta-voz do Royal College de Obstetras e Ginecologistas britânicos.

A recomendação da OMS é de que grávidas que sejam parte de grupos já aptos à vacina (como profissionais de saúde, por exemplo) avaliem seu caso com seus médicos e decidam se querem ou não tomar a vacina.

Recentemente, estudos em processo de revisão pela comunidade científica mostraram que as vacinas de RNA mensageiro geraram boa resposta imune em grávidas.

O segundo link presente no post, também em inglês, é uma orientação oficial sobre a vacina para profissionais de saúde britânicos, que esclarece sua composição, contraindicações e outras recomendações.

A nota técnica diz que os testes da vacina em mulheres grávidas foram limitados, mas que estudos em animais não indicaram nenhum tipo de dano direto ou indireto no desenvolvimento dos fetos. Ou seja, o documento afirma, de certa forma, o contrário da publicação no Facebook e do vídeo que a acompanha.

No vídeo, o youtuber Rômulo Maraschin, que tem cerca de 900 mil seguidores em dois canais e publica conteúdo religioso e conspiratório desde 2017, reafirma as informações falsas e mostra os documentos, mas não os lê.

"É uma estratégia muito comum para dar legitimidade a conteúdos falsos. Eles contam com a probabilidade de que a maioria das pessoas não vai ler o documento em inglês para conferir", diz Pablo Ortellado.


Sobre fazer e testar vacinas
A divulgação dos percentuais de eficácia da CoronaVac após os testes clínicos feitos no Brasil causou confusão e deu margem a muitas publicações que colocavam em dúvida o desenvolvimento da vacina e seu processo de aprovação.

Na nossa análise, este foi o terceiro tipo de mensagem com mais interações, com cerca de 17%.

Muitos dos posts antivacina também mencionavam a disputa entre o governador João Doria e o presidente Jair Bolsonaro — parte deles aparecia em grupos de apoio ao presidente, e um dos que tinha mais interações foi feito pelo ex-ministro da Educação Abraham Weintraub.

Assim como no exemplo abaixo, esses posts afirmam que a eficácia geral de 50,38% da vacina significaria "um risco" para quem a toma. Outros afirmavam que esta e outras vacinas contra a covid-19 foram feitas, testadas e aprovadas rápido demais. Por isso, não seriam eficientes contra o vírus.

Mas, cientistas independentes têm esclarecido que o fato de os imunizantes contra a covid-19 terem sido feitos mais rapidamente não significa que as novas vacinas sejam menos eficientes.

"Agora, por causa da pandemia, todos querem fazer tudo mais rápido, e há financiamento abundante disponível. E esse era o principal entrave. O processo químico de produção de uma vacina normalmente não leva muito tempo. 95% do tempo é gasto com a testagem", disse à BBC News Brasil o imunologista e professor Norbert Pardi, da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos.

O que dizem os especialistas?
O post sugere que tomar a CoronaVac seria o mesmo que arriscar-se a pular de um paraquedas sem a certeza que ele funcionaria, mas não é isso o que mostram os dados.

Na prática, a eficácia de 50,38% significa que uma pessoa que não tomar a vacina terá o dobro de chances de desenvolver a covid-19 caso pegue o vírus, explicou à BBC News Brasil o médico Marcio Sommer Bittencourt, do Hospital Universitário da USP.

Ou seja, tomar a vacina significa, sempre, aumentar a sua proteção , e não arriscar-se a não estar protegido.

Além disso, os efeitos colaterais observados durante os testes da vacina foram apenas dor no local da aplicação, dor de cabeça e fadiga, segundo o Butantan.

A CoronaVac também se mostrou capaz de evitar até 78% dos casos que necessitam de algum tipo de assistência médica.

Do ponto de vista da saúde pública, menos internações (e, por consequência, menos mortes) pode reduzir muito a pressão sobre os ambulatórios e hospitais.

De uma perspectiva individual, os testes indicaram que a vacina pode transformar uma doença potencialmente fatal numa infecção mais branda e fácil de ser tratada. É o caso de outras vacinas aplicadas no Brasil que, mesmo com a eficácia entre 40 e 50% evitam casos graves.

O post também diz que o fabricante da vacina "não se responsabiliza pelo produto", se referindo à chamada "isenção de responsabilidade" pedida por alguns dos laboratórios produtores de imunizantes contra possíveis processos judiciais.

Mas advogados e médicos consultados pela BBC News Brasil dizem que a medida já era esperada e não significa que as vacinas não sejam seguras.

"Os testes clínicos mostraram que a vacina é segura. Mas, com qualquer medicamento, qualquer vacina, qualquer intervenção de saúde, tem um risco. Uma vez que você use na população, em larga escala, vão ser detectados eventos raros", disse Ariane Gomes, imunologista e PhD em medicina clínica pela Universidade de Oxford.

Sobre liberdades
A discussão sobre a suposta obrigatoriedade da vacinação contra a covid-19 também movimentou as redes sociais brasileiras entre dezembro e janeiro.

Cerca de 16% das interações aconteceram em posts afirmando que a exigência da vacinação é um ataque a liberdades civis e pessoais.

A maior parte destes posts também trazia conteúdo político e aparecia em páginas ou grupos dedicados ao presidente, ao vice, general Hamilton Mourão (PRTB-RS), ou a deputados federais da base do governo Bolsonaro, como Carla Zambelli (PSL-SP).

Em alguns casos, apresentavam informações falsas ou suspeitas infundadas sobre efeitos colaterais das vacinas, sugerindo que as pessoas estariam sendo obrigadas a tomar algo perigoso para sua saúde, em uma manobra supostamente "ditatorial".

O que diz a lei brasileira?
Na prática, vacinas no Brasil já são, de certa forma, obrigatórias, segundo explicou à BBC News Brasil a pesquisadora Natalia Pasternak, PhD em microbiologia e integrante da Equipe Halo, uma iniciativa da Organização das Nações Unidas (ONU) para aumentar o alcance da ciência.

"A vacina nunca é obrigatória no sentido de que ninguém é vacinado contra a sua vontade, mas existem restrições da vida civil que você pode sofrer se não puder apresentar um atestado de vacinação", disse.

Há décadas, brasileiros convivem, por exemplo, com a exigência de apresentar cadernetas de vacinação em dia para matricular os filhos em colégios públicos. Os concursos públicos, estaduais e federais, também exigem o mesmo, assim como o alistamento militar, programas de distribuição de renda como o Bolsa Família e algumas viagens internacionais. Não vacinar crianças também pode ser ilegal em alguns casos.

Em novembro de 2020, o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, chegou a emitir um parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF), afirmando que a vacinação obrigatória é amparada pela Constituição no Brasil, e sua aplicação deve ser determinada pelo Ministério da Saúde. O STF também considerou que a obrigatoriedade é constitucional.

A OMS afirmou diversas vezes que apoia a vacinação voluntária por meio de programas de informação e conscientização, e recomenda cautela com relação a multas e penalidades.

Mas, à BBC News Brasil, o órgão também admitiu que a vacinação obrigatória pode ser uma opção adotada por países com baixa adesão espontânea e níveis "inaceitavelmente altos" de contágio pela doença.

Sobre conspirações
Durante dezembro de 2020 e janeiro de 2021, apenas 4% das interações aconteceram em posts contendo teorias conspiratórias novas ou já estabelecidas sobre as vacinas.

Uma teoria da conspiração geralmente fala de "um plano maléfico, planejado em segredo por um pequeno grupo de indivíduos poderosos", segundo o Dr. Jovan Bydord, professor de psicologia da Universidade Aberta de Londres.

Por exemplo, a ideia de que o vírus Sars-CoV-2 teria sido criado por uma elite global com o objetivo de eliminar parte da população, implantar um governo autoritário e criar uma "nova ordem mundial". As vacinas, nesse contexto, seriam dispositivos para alterar o DNA humano ou implantar microchips que controlem as pessoas.

"A crença de que o mundo é finalmente controlável é um impulso muito poderoso às teorias conspiratórias em momentos de crise, onde há um vazio de explicações", disse Bydord à BBC News.

Em alguns casos, como no exemplo abaixo, essas teorias são salpicadas de menções à maçonaria, aos Illuminati (nome dado a diversos grupos secretos, tanto reais quanto fictícios) e outros elementos fantásticos. Eles são inclusive conectados a figuras políticas do Brasil.

"Apesar de terem aparecido pouco no Facebook, essas teorias conspiratórias antivacina têm circulado muito em grupos de WhatsApp no Brasil, em textos, áudio e vídeo", alerta o pesquisador Pablo Ortellado.

Posts em outras categorias também podem trazer alguns elementos de teorias conspiratórias, como menções a uma "Terceira Guerra Mundial" ou a uma suposta intenção nefasta de Bill Gates por trás da criação de vacinas.

Algo que precisamos entender é que as teorias conspiratórias só funcionam quando elas conseguem explicar tudo. E essas comunidades querem continuar tendo relevância nas redes sociais. É por isso que, quando começou a pandemia, passaram a incorporar as vacinas em suas teorias.Seb Cubbon, pesquisador de manipulação das mídias sociais da First Draft.

O que dizem os fatos?
O post utiliza uma reportagem verdadeira da revista Veja sobre a morte de idosos noruegueses que haviam recebido a vacina da Pfizer, para insinuar que a vacina faria parte de uma conspiração envolvendo Bill Gates.

O caso realmente foi investigado pela agência e saúde norueguesa, a Noma, no início de janeiro.

Já no final do mês, entretanto, o Instituto Norueguês de Saúde Pública divulgou um comunicado dizendo que nenhuma ligação foi estabelecida entre a vacina e quaisquer mortes. Um comitê da OMS também analisou os casos e concluiu o mesmo.

Situações semelhantes também já foram descartadas em outros países, como a Alemanha e Inglaterra, que já investigou mais de 400 casos. Não há evidência de qualquer tipo de plano para causar mal a idosos ou à população em geral por meio das vacinas contra a covid-19.

Também não existe nenhum tipo de microchip criado por Bill Gates nas vacinas, como diz a teoria conspiratória.

Os rumores se espalharam em março, quando Gates disse em uma entrevista que eventualmente "teremos alguns certificados digitais" que seriam usados para mostrar quem se recuperou, foi testado e, finalmente, quem recebeu a vacina. Ele não fez menção a microchips.

Isso levou a um artigo amplamente compartilhado com o título: "Bill Gates usará implantes de microchip para combater o coronavírus".

O artigo faz referência a um estudo, financiado pela fundação do bilionário, sobre uma tecnologia que poderia armazenar os registros da vacina de uma pessoa em uma tinta especial administrada com uma injeção.

No entanto, a tecnologia não é um microchip e funciona como uma tatuagem invisível. Ela ainda não foi implementada, não permitiria que pessoas fossem rastreadas e informações pessoais não seriam inseridas em um banco de dados, diz Ana Jaklenec, cientista envolvida no estudo.

Sobre Deus e ética
Entre as publicações com as quais os brasileiros mais interagiram, só 1% se colocavam contra as vacinas de covid-19 citando motivos religiosos ou éticos.

Estas publicações podem fazer afirmações falsas de que as vacinas seriam produzidas com células de fetos abortados, algo que já foi refutado por cientistas e pelas empresas produtoras dos imunizantes. Outros posts afirmam que a cura do vírus viria pela fé, sem a necessidade de uma vacina.

Em nossa análise, os posts com mais interações associavam o uso de máscaras e a necessidade de vacinar-se contra a covid-19 à "marca da besta", em referência ao livro do Apocalipse, na Bíblia.

A maior parte deles aparecem em páginas e grupos que se declaram de denominações evangélicas. É o caso do exemplo abaixo.


O que diz a teologia?
O teólogo Magno Paganelli, que é doutor em História Social pela USP e estuda as interpretações do Apocalipse desde os anos 1990, lembra de outros momentos em que inovações tecnológicas, por exemplo, foram tidas como "a marca da besta" — mesmo antes das redes sociais.

De acordo com a Bíblia, a marca permite a quem a possui fazer transações comerciais.

"Quando surgiu o cartão de crédito, ele também foi considerado por alguns como a marca da besta. Depois veio o código de barras, o código QR. Imaginava-se que o sujeito pudesse ficar marcado, perder a salvação, passar a fazer parte de um sistema global maligno, contrário a Deus", diz.

"As máscaras e as vacinas não têm nada a ver com isso, nem mesmo se estivermos pensando estritamente no que diz o Apocalipse. Estar protegido de uma pandemia é outra coisa."

De acordo com Paganelli, é preciso que, mesmo considerando sua fé, as pessoas se recordem de que temos uma separação entre a Igreja e o Estado, e que "cabe ao Estado impor normas para nos proteger e promover o nosso bem-estar".

Durante o período de ansiedade, luto e incertezas da pandemia, a aquisição de Bíblias aumentou em países como EUA, Reino Unido e Brasil. Até mesmo em formato digital, o livro sagrado do cristianismo tem aumentado o faturamento de editoras brasileiras, segundo reportagem da revista Veja.

No entanto, o teólogo afirma que, apesar do interesse por previsões do fim dos tempos, é preciso considerar o livro inteiro, não apenas um capítulo.

O próprio Apocalipse, no seu final, fala que haverá cura para todas as nações. Não é um livro só de destruição, é um livro de esperança também. Ele aponta para um final positivo. Não adianta pegar um texto isolado do livro e nem um livro isolado da Bíblia para tirar uma conclusão.Magno Paganelli, teólogo

Como escapar da informação falsa?
O surgimento da desinformação nas conversas sobre vacinas no momento atual é esperado e, de certo modo, inevitável, segundo Rory Smith, da First Draft.

"Seres humanos não gostam de momentos de incerteza, como o que estamos vivendo. Isso cria um processo chamado de atribuição de sentido coletiva, no qual as pessoas pegam qualquer informação, de boa ou má qualidade, para tentar entender o que está acontecendo", explica.

Mas, isso não quer dizer que é impossível não ser enganado.

"O mais importante é sempre manter um certo nível de desconfiança de tudo o que você recebe pelas mídias sociais e aplicativos de mensagens", afirma.

Busque as agências de saúde, as fontes científicas. Muitas vezes, o conteúdo falso já estava por aí e já foi esclarecido. Só mudava o nome da vacina ou a doença à qual ele se referia.Rory Smith, First Draft

Pressionadas por analistas e órgãos internacionais durante a pandemia, as próprias redes sociais têm tentado mostrar onde é possível encontrar informações de confiança.

Em nota à BBC News Brasil, o Facebook afirmou: "Pesquisas mostram que a melhor maneira de combater a hesitação em tomar vacinas é conectar as pessoas com informações confiáveis de autoridades de saúde".

"Estamos adicionando rótulos em qualquer post que discuta vacinas, para mostrar informações adicionais da Organização Mundial de Saúde", diz o comunicado.

A empresa, que tem sido criticada por agir de maneira lenta e não fazer o suficiente para combater a desinformação, mesmo antes da pandemia, afirma que seu sistema não é perfeito, mas que está trabalhando para aperfeiçoá-lo.

Metodologia
A pesquisa dos posts foi inspirada no método desenvolvido por Rory Smith e Seb Cubbon e utilizado pela ONG First Draft, em seu relatório "Under the surface: Covid-19 vaccine narratives, misinformation and data deficits on social media" (Sob a superfície: narrativas sobre a vacina de Covid-19, desinformação e déficits de dados nas mídias sociais, em tradução livre). Deste relatório, utilizamos as categorias, suas definições e a classificação dos posts, com algumas adaptações.

Utilizando um conjunto de 20 expressões e palavras-chave relacionadas às vacinas de covid-19, buscamos publicações com o maior número de interações (curtidas, reações, comentários e compartilhamentos) feitas em português no Facebook entre o dia 1º de dezembro de 2020 e o dia 31 de janeiro de 2021, em grupos e páginas não verificadas.

Dezembro e janeiro foram escolhidos por terem sido os meses em que as vacinas de covid-19 começaram as ser aprovadas e aplicadas no mundo e no Brasil.

Utilizamos o filtro de páginas não verificadas para reduzir a possibilidade de que as publicações fossem de órgãos de governo, portais de notícias ou agências de saúde. Nenhum tipo de filtro relacionado a partidos ou nomes de políticos foi utilizado.

O resultado foi uma base de 85.624 publicações.

Em seguida, utilizando um programa feito por Marcio Moretto Ribeiro, coordenador do grupo Monitor do Debate Político no Meio Digital, da USP, extraímos uma amostra dos posts que fosse representativa do total e proporcional ao número de interações de cada um deles.

A mostra era aleatória, mas o programa fazia com que os posts com mais interações aparecessem com mais frequência. Com esse método, garantia que a proporção de interações que tivemos em cada um dos temas na nossa amostra realmente refletia o que ocorre na realidade, com uma certa margem de erro.

Analisamos 1.600 posts, dos quais 346 foram considerados antivacina. Destes, 36% pertenciam ao tema "Poder e dinheiro", 25% à categoria "Reações e necessidade", 17% a "Desenvolvimento e testes", 16% a "Liberdades", 4% a "Teorias da conspiração" e 1% a "Deus e ética". A margem de erro é de 5 pontos percentuais para mais ou para menos.

Para ilustrar a reportagem, foram escolhidos, entre os exemplos com mais interações, os mais representativos de cada tema.

Créditos
Pesquisa e reportagem: Camilla Costa - @_camillacosta
Edição: Carol Olona e Rafael Barifouse
Design e ilustrações: Cecilia Tombesi
Programação: Alex Nicolaides e Evisa Terziu
Com a colaboração de Adam Allen, Sally Morales, Luis Fajardo, Rose Delaney, Rachelle Krygier e Camilo Gomez
Projeto liderado por Carol Olona
Agradecimentos: Rory Smith, Seb Cubbon, Claire Wardle, Pablo Ortellado, Marcio Moretto Ribeiro, Flora Carmichael e Pascal Fletcher

Fonte: BBC